Das lembranças de Gabriel Graham Storm
Desembarquei no porto em Paris e como de costume, meu tio George estava a minha espera pra me levar ate o aeroporto. E também, como de costume, chegamos lá quando já estavam fazendo a ultima chamada para o vôo e quase solicitando minha presença nele.
- Atenção! Passageiros do vôo 5496 com destino ao Rio de Janeiro, Brasil. Embarque imediato no portão 3B. Ultima chamada.
- Tem certeza que não pode ir?
- Infelizmente não... Diga a sua mãe que darei um jeito de vê-la antes de Julho.
- Ta bom... Tchau tio George, até a volta!
Despedi-me do meu tio e atravessei o portão correndo, largando meu cartão de embarque às pressas na mão da aeromoça e derrubando o resto que ela segurava. Todos os passageiros já estavam acomodados e tracei uma reta ate meu assento, evitando os olhares estressados que a maioria lançava em minha direção. Ainda bem que não havia trazido meu malão, não teria tempo para despachá-lo. Amassei minha mochila nos compartimentos acima dos assentos e me afundei na poltrona, permitindo que o avião decolasse.
Sai de Beauxbatons para passar as festas de fim de ano em casa decidido: iria convencer minha mãe a me apresentar ao meu pai. Venho pedindo isso já faz uns anos e tenho sempre o apoio do meu padrinho na causa, mas ela sempre escorrega com uma boa desculpa. Tio Scott já ate se ofereceu para fazer isso no lugar dela, mas mamãe jurou que nunca mais falaria com ele se ele ousasse fazer isso. Como ela parecia falar serio, ele desistiu. Mas dessa vez ela não poderia dizer não, tinha todo um discurso preparado, que vinha ensaiando há algumas semanas. Só esperaria passar uns dois dias.
Acordei com alguém me sacudindo e uma aeromoça morena apareceu meio fora de foco quando abri os olhos, os óculos tortos no meu rosto. Já havia chegado, depois de 11 horas de viagem e uma escala chata em São Paulo. Estava tão cansado que consegui dormir de novo nos 45 minutos restantes de vôo. Catei minha mochila e sai do avião quando já não havia ninguém dentro dele. Meu padrinho já estava a minha espera no desembarque e carregava uma caixa que parecia ser de chocolate.
SF: Quanto tempo garoto! Porque demorou tanto?
GS: Dormi no vôo, só sai porque me acordaram...
SF: Isso é pra você, melhor comer no carro antes de sua mãe chegar ou ela acaba comigo.
GS: Obrigado tio Scott! Mamãe não esta casa?
SF: Não, ainda esta presa no hospital, me pediu para buscá-lo. Ela nos encontra lá.
Assim que atingimos a orla do Rio de Janeiro, me senti em casa novamente. Todo mundo diz que se sente em casa na escola, mas eu não, nem um pouco. Aqui é meu lar. Nessa época está nevando na França enquanto aqui está um sol de rachar, é verão. Fui tirando os casacos dentro do carro antes que derretesse, enquanto admirava a paisagem a caminho de casa. Morava com a minha mãe em um apartamento na Lagoa e meu padrinho no mesmo prédio, qualquer coisa era só subir as escadas. Fui direto para a casa dele, esperar até que ela chegasse do trabalho. Adorava ficar lá, era sempre divertido. Tio Scott é solteiro e tem uma coleção completa dos melhores jogos de videogame que existem. Sem contar o estoque de porcarias pra se comer na geladeira. Mamãe fica louca toda vez que passo tempo demais aqui, ela diz que ele me estraga.
Estávamos na 5ª rodada de um jogo violento, quando a porta se abriu e a tela da TV ficou preta. Mamãe estava parada ao lado dela e olhava ao nosso redor. Baldes de sorvete jaziam no chão, junto com pacotes de biscoito amassados e latas de refrigerante vazias. Não foi bem uma recepção calorosa que eu tive ao revê-la depois de quase cinco meses longe...
LS: Que zona é essa? E que coisa horrorosa é essa na TV Scott? Já não falei que não quero o meu filho jogando essas porcarias?
SF: Ora Lou, relaxa! Não é um joguinho inocente que vai estragar o garoto!
GS: Oi mamãe, também senti sua falta!
Ela estava furiosa, mas eu tinha meus meios de amolecê-la. Sarah, minha madrinha, me disse uma vez que tenho o sorriso idêntico ao do meu pai e minha mãe nunca resistiu a ele. Então para desarmá-la, bastava sorrir. E foi o que fiz. Ela se derretia toda sempre que sorria para ela e veio logo me abraçar, esquecendo o jogo brutal que tio Scott escondia debaixo do sofá para ela não atira-lo pela janela.
LS: Vamos pra casa, tenho que conversar com você e acho que vai gostar.
Sai da casa do tio Scott curioso. O que ela teria pra me dizer? Mamãe estava estranha, mas não era um estranho ruim. Ela parecia feliz, mais do que o normal, como se algo realmente bom tivesse acontecido ou estivesse pra acontecer. Entrei e fui logo sentando no sofá, esperando que ela dissesse o que tinha em mente. Mamãe pegou algo que não consegui ver o que era na estante e se sentou ao meu lado, ainda sorrindo.
GS: O que é isso? – disse pegando a pasta da mão dela e olhando fotos de uma casa.
LS: Nossa nova casa.
GS: Vamos nos mudar? Por quê? Eu gosto daqui!
LS: Não vamos nos mudar, é só por um tempo. Vamos morar nela durante suas férias de verão.
Olhei outra vez as fotos, sem entender. A casa não parecia com nenhuma aqui do Rio, não reconhecia o bairro. Uma folha que parecia uma escritura cai do meio delas e peguei para ler. O endereço dizia que a casa ficava em Londres. Li pelo menos duas vezes ate a ficha cair e olhei para minha mãe, pedindo uma explicação.
GS: Pensei que você não quisesse mais pisar em Londres...
LS: Algumas coisas mudaram. Tenho conversado com Scott sobre o rumo que as coisas estão tomando e percebi que não posso mais continuar aqui, fingindo que nada aconteceu.
GS: E por acaso você contando a verdade ao meu pai ta incluído nisso tudo?
LS: Sim. Quando o ano letivo terminar, você vai direto para a casa de George, encontrarei você lá e daremos um fim a isso. O que acha?
Não consegui responder o que achava, apenas pulei no pescoço dela, a abraçando. Enfim, todo o discurso que havia preparado não seria necessário. Ia ter o que queria em seis meses, e desde já começaria a contar os dias...
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