Sunday, May 01, 2011

Fevereiro de 1960

- Oi – Marcel apareceu se surpresa no jornal e me beijou – O que vai fazer sábado?
- Terminar esses artigos atrasados? – e mostrei a pilha de papel na mesa.
- O que acha de carros em alta velocidade correndo há duas semanas e finalmente cruzar a linha de chegada?
- Rally de Monte Carlo?
- Sim. Papai está em uma viagem de negócios, então tenho que estar presente pra entregar o troféu ao campeão, queria que me acompanhasse. Sei que você odeia esses eventos, mas podemos aproveitar pra jantar em algum lugar legal antes de voltar. E não vai ter ninguém preocupado com a minha vida social pra perguntar sobre casamento...
- Ok, já me convenceu. Que horas partimos?
- Esteja pronta às 8h, a chave de portal vai nos levar direto até o Palácio. Um carro vai nos buscar lá.

Assenti e ele me beijou outra vez, saindo da redação. Ele tinha razão, não gostava muito daqueles eventos que ele era obrigado a comparecer, mas se eu era sua namorada era melhor começar a me acostumar a eles.

ºººººº

Às 8h em ponto Marcel estava me esperando no salão comunal e, acompanhados de dois
de seus seguranças, usamos a chave de portal para chegarmos ao Palácio. Um minuto depois Charlotte e Remy apareceram com seus seguranças do nosso lado e entramos nos três carros que já estavam à nossa espera.

Os carros nos levaram direto ao local onde os pilotos cruzariam a linha de chegada e antes mesmo de abrirmos as portas eles já estavam cercados por muitos seguranças, que foram nos escoltando até a área do pódio. Já podíamos ouvir o barulho dos carros a toda velocidade pela cidade, mas ainda restavam algumas voltas para que terminassem. Marcel e Remy logo se empolgaram e não demorou nada para que dessem um jeito de darem a bandeirada final, deixando Charlotte e eu apenas olhando de longe com nossos protetores de ouvido.

A corrida terminou por volta das 10h e na hora da premiação, Remy entregou o troféu a dupla que ficou em terceiro lugar, Charlotte premiou os segundos colocados e Marcel deu o troféu à dupla campeã. A quantidade de flashes que disparavam contra os três era capaz de cegar até mesmo na luz do dia. Na hora que as duplas iam estourar as garrafas de champanhe os três se afastaram e Marcel se postou ao meu lado, não saindo mais durante o resto do evento. Estava ciente de que também estavam me fotografando junto dele, mas àquela altura do campeonato já não me importava mais. Não podia querer namorar o príncipe herdeiro e ficar anônima.

Charlotte e Remy voltaram para Beauxbatons logo depois do almoço no Palácio, mas Marcel e eu ficamos para aproveitar o resto da tarde e começo da noite. Mônaco era o único lugar onde ele podia andar um pouco mais a vontade nas ruas. Claro que sempre teria ao menos um segurança por perto, mas nenhum caminhando colado com ele. Passamos à tarde nas docas, que com o clima ainda um pouco frio, estava vazia. Marcel tinha um barco a vela que havia construído sozinho com Remy e todo ano eles participavam da regata de abertura do solstício de verão. Já haviam vencido três vezes, sendo a última no verão passado. Marcel quase foi decapitado fazendo uma manobra abusada para ultrapassar uma das velas perto da linha de chegada, enquanto o irmão controlava o mastro sozinho. E Remy ficou tão feliz com a vitória que a Rainha não conseguiu reprimir a irresponsabilidade de Marcel.

Precisávamos estar de volta à escola às 22h e como ainda tínhamos duas horas até lá, Marcel me levou para jantar em um restaurante italiano na parte alta de Monte Carlo. Sua família já tinha uma mesa especifica em uma área mais reservada e fomos direto para ela, onde a janela panorâmica nos dava toda a vista da beira-mar. Estávamos conversando sobre as comemorações do aniversário do avô dele, que seria em maio, quando o relógio de Marcel disparou. Ele o desligou, mas daí em diante não parecia mais concentrado em nada e o consultada a todo o instante.

- Algum problema? Está atrasado pra alguma coisa e esqueceu de avisar?
- Desculpe, é que está na hora dos remédios do Remy e ele sempre esquece, tenho que lembrá-lo. Charlie ficou encarregada disso hoje, mas e se ela esquecer?
- Charlotte é responsável, Marcel – segurei sua mão, que não parava de batucar na mesa – Ela não vai esquecer do Remy.
- Sempre que saio sem ele, fico pensando se quando voltar ele ainda vai estar no mesmo lugar.
- Remy está bem, ele vai estar do mesmo jeito que saiu daqui quando chegarmos a Beauxbatons.
- Eu sei que é exagero, mas é que sempre que ele piora é tão de repente que não podemos evitar. Em um minuto ele está rindo e brincando e no instante seguinte está quase desmaiando e tendo convulsões. Sou muito idiota de ficar pensando que meu irmão pode morrer de repente e eu não estar lá?
- Não, você é o melhor irmão do mundo. Remy o admira tanto, acho que você nem percebe o quanto. Só de estar sempre do lado dele já o ajuda muito, às vezes mais que todos os remédios que precisa tomar.
- E você faz o mesmo por mim – ele acariciou minha mão e sorriu – Queria lhe dar uma coisa, mas não precisa se apavorar, ok? É só um presente, eu juro.
- Marcel... – ele colocou a mão no bolso e tirou uma caixinha azul, com um anel lindo dentro.
- Quando minha avó estava doente e sabia que ia morrer, ela reuniu todos os netos e pediu que cada um escolhesse algo de sua coleção particular para guardar como recordação dela, mas a mim ela não deixou escolher. Como seu neto mais velho, ela pediu que eu ficasse com esse anel e um dia o desse a alguém especial. Você é esse alguém especial.
- Mas Marcel, não posso aceitar o anel da sua avó. Isso é valioso demais e ainda sou só sua namorada!
- Exatamente, ainda. Só temos 18 anos, ainda nem nos formamos, não temos que apressar nada, mas eu amo você, Olivia. E se você também me ama, e me agüentar por mais alguns anos, vou transformar esse anel em um anel de noivado. Mas até lá, quero que fique com ele. Não precisa usar se não quiser, apenas guarde com você.
- Se você tem certeza disso, não me importo em usar – sorri para ele e tirei o anel da caixa.
- Posso? – ele o pegou da minha mão e estendi a mão a ele.

Ele segurou minha mão direita, colocou o anel em meu dedo e o beijou. Acho que se estivesse de pé teria desabado naquele momento. Sabia do peso que aquilo trazia, mesmo não tendo havido um pedido de casamento, mas também sabia que amava Marcel e que, com o tempo, o que tivesse que acontecer, ia acontecer. E eu não ia fugir do que estivesse reservado para o meu futuro.

Naquela noite, quando já estava em minha cama no dormitório da Lux Angeli, foi a primeira vez desde que comecei a namorar Marcel que sonhei com um conto de fadas de príncipes e princesas.