Sunday, March 22, 2009

O café da manha corria calmo como de costume. Ainda consumidos pelo sono, Philipe, Marcel, Olívia, Danielle e Anabela tentavam ignorar a conversa animada que se desenvolvia entre Bianca, Kwon e Andreas. Para eles, era insuportável aquele bom humor matinal dos três, sempre dispostos e com a corda toda já cedo. Os três discutiam sobre os rumos do Campeonato Francês de Quadribol, alheios aos bocejos dos amigos, quando foram interrompidos por Alphonse Bacellar, um dos batedores do time da Lux. O garoto sentou-se à mesa aparentando irritação e as atenções foram desviadas para ele.

- Algum problema, Bacellar? – Philipe encarou o colega curioso.
- Sim, Perrineau! – Alphonse respondeu irritado, lançando um olhar rápido a mesa da Sapientai – O diretor vai anular a partida contra a Sapientai, vão tirar os nossos pontos e passar pra eles!
- O QUE? – Marcel ficou de pé na mesa, irritado – Que história é essa? Por que isso agora? A partida foi em Janeiro!
- Mas só agora eles caíram pra terceiro na tabela – Philipe comentou balançando a cabeça – Isso tudo por que escalei Bianca?
- Parece que sim. O capitão deles foi reclamar que a partida estava fora das regras da escola.
- Eu vou arrebentar a cara daquele idiota do Derkier! – Marcel ameaçou ir até a mesa da Sapientai, mas Kwon e Andreas o seguraram.
- Você não vai fazer nada, Marcel – Philipe também levantou e falou em tom de aviso – Vou conversar com o diretor, tentar encontrar outra forma de punição, mas não vamos partir pra ignorância.
- Já estou arrependida de ter aceitado jogar – Bianca disse desanimada e Philipe segurou seu queixo, forçando-a a olhar para ele.
- Não se culpe, a decisão foi minha e não me arrependo, faria outra vez se tivesse a chance.
- Esse seu namoradinho, hein Dani? – Marcel cutucou a amiga, encarando a mesa da Sapientai de lado.
- Não meta o Henri nessa confusão, ele não é o capitão do time e não foi dele a decisão de reivindicar os pontos! – Danielle defendeu o namorado, olhando feio para Marcel.
- Mas aposto que está adorando isso tudo e apoiando o capitão de meia tigela.
- Parem os dois – Philipe olhou severo para os amigos – Nossa situação já não está boa, vai piorar se começar a ter briga entre nós.
- Meu irmão está certo, não precisamos começar a brigar, não é assim que vamos resolver as coisas – Kwon apoiou Philipe e olhou com reprovação para Marcel e Danielle.
- Desculpa Dani – Marcel desfez a cara de irritação e sorriu para a amiga – Sei que a culpa não é do Renoir. Exagerei um pouco – Danielle sorriu de volta e ele pegou a mochila na mesa – Mas isso não vai ficar assim, não vou deixar que a casa perca os pontos.
- O que vai fazer, Marcel? – Philipe segurou o braço do amigo, o impedindo de sair – Nada de brigar.
- Não vou brigar, relaxa – Marcel sorriu maroto – Confiem em mim.

Philipe soltou seu braço e deixou que o amigo saísse, mas não o perdeu de vista até que tivesse certeza que não iria até a mesa da Sapientai. Se bem conheciam Marcel, sabiam que ele ia aprontar alguma coisa muito em breve.

*****

O dia de aulas já estava quase no fim e Marcel ainda não dava pistas do que estava aprontando para evitar que a Lux perdesse os pontos da partida contra a Sapientai. Cada movimento seu era observado com atenção pelos amigos e todos ficaram apreensivos quando ele se levantou de repente no meio da aula de poções, mas relaxaram ao perceberem que ele só pretendia usar o banheiro. Já estavam no 5º tempo de aula, História da Magia Francesa, e Anabela convencera a todos que Marcel já havia esperado demais, se pretendesse fazer qualquer coisa ainda naquele dia já teria feito. Convencidos de que Marcel não faria nada, se dividiram em prestar atenção a aula, dormir ou simplesmente conversar em voz baixa. Mas 30 segundos de distração era tudo que Marcel precisava.

O garoto se levantou e, rápido como um gato, subiu na mesa, sentando de pernas cruzadas por cima do pergaminho que deveria estar sendo usado para copiar a matéria. Os olhares de toda a turma se voltaram para ele e se dividiam entre observá-lo sentado em cima da mesa e observar a professora Cordelia de costas para a turma, alheia a novidade. Mas as conversas paralelas e as risadas que aos poucos se formavam logo chamaram sua atenção. Ela se virou irritada com o falatório e seus olhos pararam em Marcel. Ele sustentou o olhar da professora, sem se abalar.

- Monsieur Grimaldi, o que pensa que está fazendo? – perguntou em tom de irritação – Desça já dessa mesa. Defossez não ensinou que lugar de sentar é na cadeira?
- Estou protestando contra o time da Sapientai – Marcel respondeu tranqüilo.
- Perdão? – Cordelia cruzou os braços, impaciente.
- Querem anular uma partida porque uma garota jogou no nosso time. Não aceitam terem perdido para uma mulher e querem anular o jogo.
- E o que a minha aula tem a ver com isso?
- Nada, mas achei o momento propicio, já que ninguém estava mesmo prestando atenção – a turma inteira riu e Cordelia bufou.
- Saia daí agora ou irei chamar o diretor! – ameaçou
- Faça esse favor, sim? Quero que ele venha até aqui!
- Não reivindicamos os pontos por termos perdido para uma garota! – Erik Derkier, capitão da Sapientai, se levantou ofendido – As regras são claras, garotas não podem jogar.
- Então por que demoraram 2 meses para reclamar isso? – Alphonse também ficou de pé e subiu na mesa – Também vou protestar.
- Acho que as garotas deveriam ter o mesmo direito dos garotos. Se elas quiserem jogar no time das casas, deviam ter permissão – Anabela também se levantou e ficou de pé na mesa – Chega dessa ditadura machista!
- Direitos iguais sim – Bianca também se sentou em cima da mesa – Quero poder jogar no time da minha casa, tenho capacidade para jogar de igual pra igual com os garotos, acho que já pude provar isso.
- Não tem nada a ver isso que estão falando, só agimos de acordo com as regras e nela garotas não podem jogar! – Derkier tentou se defender mais uma vez, mas ouviu um coro de vaias da maioria das garotas.
- Vamos protestar pelo direito das garotas jogarem no time das casas! – Andreas ficou de pé com o braço erguido e se juntou aos amigos, sentando-se à mesa.

Philipe e Kwon se olharam rindo e também se levantaram, seguidos por Olívia e Danielle. Um a um, todos os alunos da sala foram levantando e ocupando suas mesas, até restarem apenas os jogadores do time da Lux. Danielle lançou um olhar de decepção para Henri que surtiu efeito, pois o garoto foi o primeiro do time adversário e se levantar e também sentar a mesa. Ao ver que seus amigos não fariam o mesmo, deu um soco de leve nos braços de Edmond e Enrico, que mesmo contrariados, também ficaram de pé. Cordelia saiu da sala irritada e voltou minutos depois arrastando o diretor pelo braço, apontando Marcel como o agitador do protesto.

- O que está acontecendo aqui? – o diretor perguntou mantendo a calma e todos começaram a falar ao mesmo tempo – Silencio! Monsieur Grimaldi, queira explicar-se, por obsequio.
- Queremos que garotas possam jogar no time das casas, elas têm o mesmo direito que nós temos – Marcel explicou em um tom de voz tranqüilo.
- As regras da escola são essas desde sua fundação – o diretor replicou – Por que deveria mudar agora?
- Porque os tempos estão mudando. Agora as garotas de Beauxbatons querem jogar e são impedidas por regras bestas.
- As regras não são bestas, foram feitas para manter a ordem.
- Bom, está claro que essa regra não está mantendo a ordem – Marcel disse sarcástico e alguns alunos sufocaram risadas.
- Monsieur Grimaldi, não pense que por ser filho do Rei de Mônaco será poupado de suas gracinhas. Posso lhe dar uma detenção pesada por esse comentário debochado.
- Jamais esperei imparcialidade por conta da minha posição na sociedade. Estou aqui, sentado em cima da mesa, lutando pela igualdade de direitos como um aluno qualquer. Que é o que sou nessa escola, um aluno como outro qualquer.
- Com licença, diretor. Posso falar? – Bianca levantou a mão e o diretor assentiu com a cabeça – Sou fascinada por quadribol, minha família inteira é envolvida com o esporte, e só queria o direito de poder mostrar que posso jogar pelo time da minha casa. Philipe me deu essa chance e provei que garotas podem sim jogar no meio de garotos e se sair muito bem. Não é justo que culpe o time por isso e tirem os pontos conquistados na partida.
- Pontos conquistados por mérito do time, diga-se de passagem – Marcel completou – Bianca jogou melhor que todos nós, deveria ter permissão de jogar. Derkier decidiu reclamar dos pontos 2 meses depois, porque seu time caiu para terceiro lugar na tabela.
- Isso não é verdade! – Derkier ficou de pé, irritado.
- Se não fosse verdade, teria reclamado logo que a partida terminou! – Philipe se irritou também e o acusou – Aceite que perderam para uma garota. Aceite que é contra times mistos por saberem que vão perder sempre – todas as meninas da sala aplaudiram Philipe e deram inicio a uma discussão cruzada com Derkier.
- Já chega! – o diretor falou com a voz grave e todos se calaram – Os pontos da Lux serão mantidos, se alegam injustiça na anulação da partida – os alunos comemoraram e ele pediu silencio outra vez – Quanto a garotas jogarem nos times, mantenho minha posição de não mudar as regras da escola.
- Mas isso é ridículo! – Marcel exclamou exaltado – Voltamos a 1920!
- Monsieur Grimaldi, é meu ultimo aviso, pare imediatamente! – ele olhou severo para Marcel, que se calou, mas manteve a expressão desafiadora – As regras não podem ser mudadas sem um consenso geral dos antigos diretores da escola e do Ministério da Magia. Não cabe somente a mim mudar uma regra imposta desde a fundação de Beauxbatons.
- Então convoque uma reunião com eles! – Marcel tornou a falar, inconformado.
- E não cabe ao senhor me dizer o que fazer, mas garanto que qualquer decisão tomada será comunicada a vocês. Por enquanto, as regras são mantidas. E esse protesto termina aqui. Quem permanecer em cima da mesa pelos próximos 30 segundos terá 20 pontos descontados. Assunto encerrado!

O diretor saiu da sala e rapidamente os alunos desceram das mesas, até mesmo Marcel. A aula já estava encerrada e Cordelia liberou a turma, saindo da sala impaciente com toda aquela confusão.

- Muito bom, Marcel! – Philipe deu três tapas em suas costas – Não perdemos os pontos, você conseguiu.
- É, mas ainda não consegui a permissão para que Bianca faça parte do time.
- Mas chegamos perto – Bianca animou o amigo – Ele deu a entender que vai haver uma reunião com o conselho. Quem sabe não nos liberam?
- Não temos nada a perder em ter esperança nisso, então vamos ficar confiantes, ok? – Anabela falou também animada – E se nada se resolver, podemos organizar outro protesto. Quem sabe até com a escola toda? Aposto que muitas garotas querem esse direito também.
- É, quem sabe... – Marcel falou pensativo, sorrindo mais animado.

O diretor agora sabia que muitos alunos eram contra a proibição de que garotas jogassem no time das casas e cabia a ele mudar isso. E aos interessados, só restava aguardar uma resposta.