Sunday, November 29, 2009

Acordei tarde na manhã de sábado pela primeira vez desde que havia retornado a Beauxbatons, o que significava que havia perdido o café da manhã. Já não tinha mais ninguém no dormitório, assim como o salão comunal, que estaria totalmente deserto se não fosse por duas pessoas que conversavam no sofá.

- Bom dia, bela adormecida – Marcel brincou ao me ver descendo as escadas – Está tudo bem? Nunca vi você dormir tanto.
- Bom dia, meninos. E está tudo bem sim, só estava cansada – respondi sorrindo - O que está fazendo aqui a essa hora? Não deveria estar no campo para os testes de quadribol? – perguntei apontando para o uniforme do time que ele já usava.
- Eu não estava me sentindo bem e ele ficou pra trás – Remy respondeu com a voz fraca e sentei ao lado dele – Mas já estou melhor, pode ir, Marcel.
- É, vá. Eu fico com ele – falei quando Marcel hesitou – Hoje é um dia importante para o campeonato de quadribol de Beauxbatons, você não vai querer perder.
- Qualquer coisa me chama, por favor – ele olhou sério para Remy e ele assentiu – Obrigada, Liv.
- Sem problemas – Marcel levantou e se apressou para chegar à porta, mas o alcancei antes que pudesse sair – Marcel, será que depois podemos conversar sobre essa história toda que inventamos? Não estou me sentindo bem.
- Quer acabar com ela logo? – ele não pareceu surpreso quando confirmei com a cabeça – Tudo bem, mais tarde conversamos para decidir como vai ser.

Ele deu um sorriso que pareceu um pouco desapontado antes de sair, mas devia ser impressão minha. Conhecia Marcel há anos e sabia que ele estava sentindo falta de namorar de verdade, não apenas fingir. Devia estar desesperado para sair dessa relação de faz de conta e ficar livre para fazer o que quisesse, mas estava esperando que eu tomasse a iniciativa.

Passei o resto da manhã com Remy no salão comunal da Lux, conversando sobre bobagens para não deixá-lo se desanimar por estar doente. Tinha sido uma grande vitoria para ele conseguir a permissão de seus pais para freqüentar Beauxbatons e se tivesse alguma recaída, ninguém tinha duvidas de que eles o tirariam da escola no mesmo instante, e Remy não queria ir para casa.

Já estava perto da hora do almoço quando ele afirmou que estava se sentindo melhor e pediu para irmos assistir ao resto do teste para o time da Lux. Embora um pouco relutante, acabei o acompanhando até o campo. Os testes ainda estavam a todo vapor, uma fila de alunos ainda sem terem sido testados aguardavam sua vez e o deixei na arquibancada com Anabela e os outros meninos para ir ao banheiro. Ia sair para lavar as mãos quando ouvi duas vozes entrando e meu nome ser pronunciado pela dona da mais insuportável. Recuei e fiquei imóvel, ouvindo o que diziam

- Olívia? Irmã do Andreas? – Isabella perguntou quando entrou com Estelle no banheiro.
- Existe outra Olívia nessa escola “namorando” o príncipe? – Estelle falou e notei o sarcasmo ao pronunciar a palavra namorando.
- Mas porque você está cismada com o namoro deles?
- Porque eu não acredito que seja real – Estelle falou confiante e senti minhas pernas tremerem – Ela não é pro bico dele, Marcel é popular demais para namorar uma mosca-morta como aquela garota. Eles não combinam e acho que estão de teatrinho. Aliás, acho não. Tenho certeza.
- E por que eles estariam mentindo sobre isso? – Isabella não parecia convencida – Não faz o menor sentido.
- Ah não sei, talvez ela esteja chantageando ele. Não se preocupe, vou descobrir isso.
- Posso saber como pretende fazer isso?
- Vou atingi-los no pronto fraco. Marcel é mulherengo, se esse namoro for mesmo de mentira, não vai resistir a uma garota se atirando para cima dele.
- Então você vai dar em cima dele descaradamente?
- E dizem que você não é esperta... – Estelle debochou da amiga – Vamos, quero estar no campo de quadribol quando os testes da Lux terminarem.

Ouvi a porta do banheiro fechar e abri a da cabine, sentindo que minhas pernas iam ceder a qualquer momento. Sim, ela estava certa sobre o nosso namoro, mas não podia deixar aquela garota insuportável conseguir o que queria. Voltei correndo para o campo e Remy e Anabela já estavam na parte baixa da arquibancada, praticamente no banco de reservas, onde uma pequena confusão movimentava o campo.

- O que aconteceu? – perguntei esbaforida por ter corrido até lá.
- O artilheiro cortado está criando caso porque perdeu a vaga para a Bia – Remy respondeu sem desviar a atenção do campo.
- Cassel, Bianca foi melhor que você hoje, em todos os sentidos – Philipe tentava apaziguar a confusão – Não posso dar a vaga a você diante disso.
- Seja homem e fale a verdade, só está dando a vaga a ela porque é sua namorada! – Tiago Cassel respondeu irritado – E qual é? Uma garota como apanhadora também? Esse time vai pro buraco esse ano!
- Nosso time só tem a ganhar com a entrada das meninas, elas deram um show hoje – Marcel respondeu sem paciência.
- Alexis e eu merecemos as vagas, seu otário – Bianca rebateu nervosa.
- Cale a boca, garota! Só está toda valente porque tem um monte de homem pra te proteger!
- Não preciso da proteção de ninguém pra quebrar a sua cara! Vem pra cima, vem!
- Bia, segura a onda! – Philipe bateu com a mão no peito de Tiago quando ele avançou para cima dela e Marcel rebocou Bianca para longe da confusão – Já tomei minha decisão, os nomes que anunciar, por favor, dirijam-se ao vestiário, vocês estão no time: Bianca Latour, Kwon Perrineau, Marcel Grimaldi, Alphonse Bacellar, Levy Boniface e Alexis Martín. Os que não conseguiram, não desanimem. Ano que vem todos terão outra chance.

Os seis selecionados por Philipe o acompanharam até o vestiário e os que restaram foram aos poucos deixando o campo. Procurei Estelle na multidão e vi que ainda estava no alto da arquibancada com a amiga, então pedi a Remy que ficasse no banco de reservas esperando até eu voltar e corri até a porta do vestiário para esperar Marcel sair. Ele saiu por último com Bianca e quando pedi para falar com ele a sós, ela piscou e deu a risada irônica que me cercava ultimamente, apertando o passo para alcançar Philipe e Kwon.

- Que cara é essa? – ele perguntou rindo e eu devia estar parecendo afobada.
- Você não pode me trair com a Estelle! – falei atropelando as palavras e ele arregalou os olhos.
- O que?
- Estelle está vindo até aqui e vai fazer tudo que estiver ao alcance para seduzir você, porque ela tem certeza que estamos mentindo e quer provar. Por favor, não me faça passar pela vergonha de terminar como a garota traída.
- É isso que está preocupando você? – Marcel riu e não entendi onde estava a graça – Liv, esse perigo você não corre. Não pode existir uma pessoa que eu mais deteste na face da terra do que Estelle Renoir. Não há a menor possibilidade dela conseguir me seduzir – ele piscou para mim sorrindo – Mas por que ela tem tanta certeza que é mentira?
- Porque ela disse que você é popular demais para dar atenção a uma mosca-morta como eu, que não tem como ser verdade porque somos o oposto um do outro.
- E você acreditou nela? – ele segurou meu queixo quando assenti com a cabeça e me fez olhar para ele – Liv, você não é mosca-morta. É uma garota linda, adorável e qualquer garoto dessa escola seria sortudo por estar com você. Não dê ouvidos a garotas invejosas como Estelle, você é muito melhor que ela.
- Sei que não tenho o direito de pedir isso, mas será que podemos manter a mentira mais um pouco?
- Claro, sem problemas. – ele sorriu gentil e olhou para o lado, onde Estelle entrava no nosso campo de visão – E lá vem a encrenca... Apenas relaxe, ok?

Antes que eu pudesse perguntar o porquê, já não podia mais ver Estelle, pois Marcel me tomou nos braços e me beijou. Apesar de não estar esperando por isso, não consegui lutar para me afastar. Quando senti a força das pernas começar a desaparecer, envolvi meus braços em volta de seu pescoço e, pela primeira vez na vida, me deixei levar por uma coisa sem antes pensar nas conseqüências. E quaisquer que fossem elas, teria valido a pena.

Wednesday, November 25, 2009

O dia da final da Copa Mundial de Quadribol amanheceu ensolarado, sem uma única nuvem no céu, o que era algo bom. Não para as seleções da Inglaterra e Alemanha, que disputariam a taça, mas para os times formados apenas por garotas que disputariam uma partida simultaneamente aqui em Beauxbatons. A partida seria narrada para todo o mundo bruxo no intervalo da final da Copa pelo irmão de Bianca e o diretor, apesar de ser contra a liberação de times mistos, teria que ceder a pressão.

A escola inteira já sabia o que ia acontecer e todos apenas aguardavam a hora combinada para começarem a migrar até o campo de quadribol. Eu sabia que o diretor suspeitava que algum tipo de movimento estava sendo organizado, mas ninguém planejava nenhuma mudança e logo depois do jantar segui com Nani para a radio como combinado. Nós transmitiríamos a partida de lá para todo o castelo, que seria narrada por Danielle do campo de quadribol, e fazer a ponte entre a radio de Beauxbatons e a radio onde Pierre estava, na Grã-Bretanha. Nosso trabalho era não deixar que nada interferisse na transmissão, principalmente a parte onde Pierre entrava.

- Está tudo no lugar? – perguntei pela 5ª vez, checando os aparelhos.
- Você já conferiu isso inúmeras vezes, Kwon – Nani riu – Não tem nada fora do lugar, nossa transmissão não vai ser interrompida.
- Ei, o jogo já vai começar – Marcel bateu na porta da rádio com AJ do lado – Vamos ficar por aqui, caso alguém tente entrar.

Assentimos com a cabeça e ele fechou a porta outra vez. Nani ligou o aparelho e imediatamente ouvimos a voz empolgada de Danielle no campo de quadribol, anunciando as jogadoras dos times. Bianca era a capitã do time roxo e Flora a capitã do time laranja. A arquibancada lotada fazia muito barulho e o som dos gritos dos alunos se misturava ao som das cornetas distribuídas por Andreas e Derek para agitar ainda mais a partida.

- Kwon na escuta? Câmbio – a voz de Pierre surgiu através do radio amador que tinha na sala e peguei o aparelho.
- Pode falar, PJ. Câmbio – respondi.
- Falta meia hora pra começar a partida aqui, vou colocar vocês no ar, ok? Câmbio.
- Avise a Danielle que ela vai entrar ao vivo pro mundo inteiro – falei para Nani e ela correu até a porta para falar com os meninos – Certo PJ, pode nos colocar no ar, a partida aqui já começou. Câmbio.
- Ok, e depois de 10 minutos, coloque a minha transmissão nos auto-falantes do castelo, vou falar um pouco do jogo também. Câmbio e desligo.
- Marcel mandou o aviso pelo espelho, ela já sabe que está ao vivo na final da Copa – Nani voltou ao lugar dela animada – Nós não vamos ser expulsos por isso, não é? Porque é tão empolgante!
- Espero que não – respondi rindo e aumentei o volume do radio, recostando-me na cadeira.

Com a transmissão do jogo sendo ouvida pelo mundo bruxo inteiro, a narração de Danielle se tornou ainda mais empolgante e precisa, ela não deixava passar nenhum detalhe. Era como se estivéssemos assistindo a partida do campo, e não apenas ouvindo. Seguindo a orientação de Pierre, tirei Danielle dos auto-falantes da escola e coloquei a transmissão dele, direto da Grã-Bretanha, e levei um susto quando o ouvi anunciar para todos os ouvintes que o diretor de Hogwarts, Alvo Dumbledore, junto com os diretores das escolas de magia da Itália, Alemanha, Japão e Espanha, eram a favor dos times mistos e apoiavam a iniciativa das meninas de Beauxbatons. A algazarra no campo aumentou depois da declaração.

- Isso é sério? – Marcel entrou na sala animado – O que PJ falou?
- Espero que sim, porque já causou uma comoção enorme – Nani respondeu apontando para o radio – Está ouvindo a gritaria?
- Entrem, entrem, entrem! – Derek e Tristan surgiram correndo na sala e empurraram Marcel e AJ para dentro, fechando a porta – Charleston está vindo e está soltando fumaça pelas orelhas!

Não foi nem preciso comunicação pra sabermos o que fazer. Derek passou a chave na porta e começamos a empurrar cadeiras e uma mesa vazia contra ela, para depois nos posicionarmos prontos para usar o peso do nossos corpos contra ela também. Nani continuou na mesa de controle para manter o jogo no ar.

- Abram essa porta! – ouvimos a voz furiosa do diretor enquanto socava a madeira.
- Desculpe senhor, mas isso não vai acontecer – Marcel respondeu e Derek sufocou uma risada.
- Eu não estou brincando, abram já essa porta ou vou mandá-la pelos ares. Basta um único feitiço!
- Acho que o senhor não vai querer fazer isso, senhor – Tristan respondeu – Marcel está encostado nela. Vai querer mandar um príncipe pelos ares? – agora todo mundo abafou a risada e ele virou para trás e baixou a voz - Se fosse o orfãozinho aqui, ele estourava a porta, mas com sua alteza...
- Eu posso ouvi-lo, Sr. Thorn! – ele esbravejou do lado de fora e AJ deixou uma gargalhada escapar – E estou ouvindo-os rir, isso não vai ajudar a limpar as fichas!
- Com todo o respeito senhor, mas as nossas fichas já estão bastante cagadas. Uma advertência a mais, uma advertência a menos, que diferença faz? – Derek falou despreocupado e até Nani riu alto. Estávamos brincando com fogo, mas era impossível não rir.
- Tirem essa partida do ar imediatamente, essa brincadeira já passou dos limites!
- Não é nenhuma brincadeira, senhor – agora quem falou foi eu – As meninas só estão tentando conquistar o direito de jogar na escola, o que é normal em outras escolas.
- Sr. Perrineau, se não abrirem esta porta imediatamente, vou mandar fechar a rádio! E eu não estou blefando!

Hesitei ao ouvi-lo ameaçar fechar a radio e Marcel percebeu. Ele se colocou de pé na mesma hora e me encarou sério.

- Ele não pode fechar a rádio, trabalhei muito para que ela fosse reaberta.
- Se você tocar nessa maçaneta, juro que lhe acerto um soco no mesmo instante – ele me ameaçou – Nossa amizade vai acabar aqui.
- Talvez a gente possa conversar com ele – tentei argumentar, mas os outros já estavam parados na minha frente de braços cruzados, formando uma barreira.
- Estou falando sério, Kwon. Se afaste dessa porta.
- Meninos, não vamos brigar entre si! – Nani falou assustada – Estamos aqui para brigar com ele, e não com nós mesmos!
- Segurem ele – Marcel falou e Derek e Tristan agarraram meus braços.
- O que está fazendo? Marcel, não mexa nisso! – falei me debatendo, quando ele se aproximou dos aparelhos e Nani não fez nada para impedir.
- Vamos bater um papo com o diretor agora – ele riu malicioso e os outros o acompanharam. Marcel tinha acabado de tirar a partida do ar e colocar os microfones de dentro da rádio no ar somente no campo de quadribol e na rádio de PJ – Senhor, será que podemos negociar? Por que não deixa que as meninas joguem? Qual é o problema?
- Sr. Grimaldi, não vai haver nenhum tipo de negociação. Vou manter minha decisão. Se as garotas querem jogar quadribol, faremos uma liga separada.
- Mas por quê? – AJ perguntou – Isso não faz o menor sentido.
- Se faz sentido ou não para vocês não me importa. Essa é a minha escola e as coisas funcionam do meu jeito. Não do jeito dos alunos, do meu jeito.
- Tem certeza, senhor? – Tristan falou.
- Não gosto desse tom de ameaça, Sr. Thorn!
- Desculpe senhor, não é tom de ameaça – Tristan sorriu maroto – Mas é que estamos todos no ar e as pessoas que estão esperando o jogo da Inglaterra e Alemanha voltar querem saber se o diretor de Beauxbatons é tão inflexível assim.

Silêncio. Não ouvíamos nada do lado de fora da rádio e ninguém emitia som algum do lado de dentro tampouco. Tínhamos duas hipóteses: ou o diretor havia sofrido um infarto fulminante e estava morto no chão ou estava pensando em como entrar na rádio, matar seis alunos e fazer parecer obra do destino. Depois do que pareceu uma eternidade, Derek resolveu quebrar o silêncio.

- E sabe, como o mundo está evoluindo, nenhum pai quer colocar os filhos em uma escola onde o diretor é uma pessoa inflexível, isso não é bom para a educação – ele falou em um tom sério que fez Marcel engasgar com uma risada.
- Marcel, se formos expulsos por isso, seu pai vai ter que nos colocar no mínimo em Hogwarts – Tristan falou baixo e todo mundo concordou, rindo.
- Ninguém vai ser expulso, relaxem – ele respondeu confiante – Senhor, ainda está ai?
- Sr. Grimaldi, se desligar a rádio, poderemos conversar – o diretor finalmente respondeu.
- Desligue a rádio, Marcel – falei tapando o microfone com a mão – Ele já está se sentindo ameaçado, não vai se manter tão radical.
- Ok, vamos abrir a porta e vou desligar a rádio, mas fiquem perto dos aparelhos. Se a coisa ficar feia, liguem outra vez. E alguém chame a Bia, por favor.

Desligue rapidamente os aparelhos que nos conectavam com Pierre e Danielle e os garotos removeram as cadeiras que bloqueavam a porta, deixando o diretor entrar e Tristan sair para chamar Bianca. O diretor entrou na sala já disparando um olhar ameaçador para o aparelho de rádio em cima da mesa, mas AJ, Derek e até mesmo Nani estavam de pé em frente a ele, bloqueando sua passagem. Marcel puxou uma cadeira para o diretor, mas ele recusou e cruzou os braços.

- Então, vocês me colocaram no ar para o mundo bruxo inteiro ouvir, muito inteligente.
- Não leve para o lado pessoal, senhor – AJ falou também de braços cruzados –Todos achamos o senhor um excelente diretor, mas estávamos de mãos atadas.
- Não, tudo bem, entendo a posição de vocês.
- Tudo que aconteceu aqui hoje só tem um intuito, que é fazer com que Beauxbatons também seja uma escola de times mistos – Marcel abandonou o ar brincalhão e encarnou seu lado diplomático que só víamos em festas de sua família – Não é nenhuma coisa absurda de se pedir. Até em Hogwarts os times são mistos, por que as meninas daqui também não podem ter esse privilegio?
- Não é tão simples assim.
- Então porque não nos explica? – Bianca chegou com Tristan na sala, o uniforme roxo todo sujo.
- Eu entendo que vocês também tenham o direito de jogar, mas quadribol é um esporte violento e a única vez que permiti que uma garota jogasse, ela quebrou uma costela e isso me custou uma aluna a menos, porque seus pais pediram sua transferência. Recebi uma tonelada de reclamações de pais dizendo o quanto fui irresponsável por deixar uma menina jogar com um time só de garotos e não estou disposto a correr o risco de passar por isso outra vez. Posso liberar um time separado, mas misto não.
- Bianca jogou conosco uma vez e não se machucou – Marcel argumentou – O que aconteceu com essa menina foi um acidente isolado, não significa que todas vão sair de campo com partes do corpo quebradas.
- Se me lembro bem, foi o batedor da Sapientai que saiu machucado de campo, quando o derrubei com uma goles desviada – Bianca falou orgulhosa de ter machucado um garoto em campo.
- Todo mundo já ouviu o apelo e temos o apoio de outros diretores, ninguém acha que vai ser um problema – AJ acrescentou.
- O máximo que posso fazer é liberar que vocês façam os testes e joguem a primeira partida da temporada, mas se houver um único acidente em campo, esse privilégio termina. Fui claro?
- Não haverá acidentes, senhor – Marcel estendeu a mão e ele apertou um pouco relutante – Tem a minha palavra.
- Vou ficar de olho. Não façam com que eu me arrependa disso.

Ele deu meia volta e saiu sala e no mesmo instante começamos a pular e berrar. Nani religou a rádio e peguei o microfone, anunciando que havíamos conquistado o direito de times mistos e pudemos ouvir a gritaria que tomou conta do campo de quadribol. Mas havíamos vencido apenas a batalha, não a guerra. Para vencer aquela guerra, teríamos que nos certificar de que nenhuma garota saia machucada do primeiro jogo da temporada. E se fossemos ter Bianca em campo nesse jogo, essa guerra já era nossa.

Thursday, November 05, 2009

Havíamos voltado para Beauxbatons há quase um mês. Com a expectativa de se formar no fim do ano letivo e o fantasma dos N.I.E.M.s assombrando todos os alunos do 7º ano, os professores não estavam dando folga com os exercícios. Se todo o dia não tirasse algumas horas no fim das aulas para fazer os trabalhos, no final da semana ia sumir atrás da pilha de dever. Tanto meu irmão Eugene quanto Remy, Tomás e Frederic haviam sido selecionados para a Lux Angeli e mantínhamos os quatro sob vigilância constante, especialmente meu irmão Frederic. Na primeira semana de aula os dois conseguiram uma detenção por capturar a fada da casa que nos custou menos 10 pontos no placar. Se quisermos a Taça de Quadribol daquele ano, era bom mantê-los longe de confusão.

A volta a Beauxbatons também vinha cheia de novidades. Além de nossos irmãos na nossa casa, Olívia e Marcel agora estavam namorando. Ninguém tinha entendido direito como isso foi acontecer, já que Marcel nunca pareceu demonstrar interesse em Olívia e muito menos ela por ele. Mas apesar de tudo, todo mundo concordava que mesmo sendo o casal mais improvável de Beauxbatons, não deixavam de ser um casal perfeito. Olívia conseguia manter Marcel na linha e Marcel deixava Olívia mais solta. Sem querer, foram feitos um pro outro.

Mas o novo ano letivo não se resumia apenas a novidades chocantes, cargas horárias exageradas e deveres intermináveis. Final de Setembro significava testes para os times de Quadribol, já que a temporada nova começaria no final de Outubro. Minha ambição de fazer parte do time estava cada dia maior, e com a ajuda de meu irmão, havia bolado uma maneira de chamar a atenção de todo o mundo bruxo para o nosso problema. Iria precisar da ajuda de todas as meninas da escola e havia gastado uma semana inteira conversando com todos os grupinhos delas, marcando uma reunião na sala de Literatura Mágica.

- Tem certeza que isso vai funcionar? – Olívia me perguntava enquanto tentava acompanhar meu passo – Algumas meninas daqui são tão frescas.
- Sim, mas elas também vão querer poder encher a boca para falar que fizeram parte da maior rebelião da história de Beauxbatons – ri – Aposto que a sala está cheia.
- Por que demoraram tanto? - Anabela já estava dando bronca, nos esperando na porta da sala - Todas que se comprometeram a aparecer já estão aqui esperando!
- Desculpe, foi minha culpa - Olívia falou um pouco sem graça - Marcel me segurou no salão comunal - começamos a rir e ela ficou vermelha - Por causa do Remy, parem com isso.
- Ai, ai, esses pombinhos... - alisei a cabeça dela de brincadeira - Vamos entrar.

Abrimos a porta da sala e a barulheira que estava lá dentro se espalhou pelo corredor. Quase toda a ala feminina de Beauxbatons, incluindo as professoras Cecile e Rousseau, que tentavam conter o falatório. Danielle também lá na frente, sentada em cima da mesa conversando animada com Nani. Não tinha nenhum garoto na sala, embora os nossos amigos soubessem do que se tratava aquela reunião. Caminhei para a frente de todo mundo e subi numa cadeira, para que todas vissem que eu já estava ali e queria falar. As conversas paralelas cessaram quase que instantaneamente.

- Boa noite, meninas - comecei a falar e tinha a atenção de todas - Como já expliquei rapidamente quando as abordei durante a semana, chamei todas aqui para falar sobre a proibição de times mistos na escola. Sei que a grande maioria aqui está pouco se importando para o Quadribol, mas também sei que muitas meninas gostariam de poder ao menos tentar uma vaga nos times das casas, mesmo que não passem. Nosso diretor prometeu pensar no assunto, mas não parece ter pressa e as seleções para a temporada nova começarão nas próximas semanas, então digo que está na hora de fazermos um pouco de pressão.
- E como exatamente faremos isso? - uma menina do 5º ano perguntou do fundo da sala - Render o diretor e só soltá-lo quando aceitar nossas condições? - e algumas riram, eu entre elas.
- Se isso não levasse a expulsão, adoraria trancá-lo em um armário de vassouras, mas tenho algo menos arriscado a propor. Acho que todo mundo sabe que meu irmão que morreu era o Johnny Latour, assim como também sabem que meu irmão do meio, Pierre Latour, é o locutor de quadribol mais famoso da França. No próximo sábado acontece a final da Copa Mundial de Quadribol, entre Alemanha e Inglaterra. O mundo bruxo inteiro estará ouvindo a transmissão do jogo e antes dele começar, Pierre irá narrar um outro jogo de Quadribol. O jogo que estará acontecendo aqui em Beauxbatons, entre dois times só de garotas.
- Está sugerindo que a gente burle as regras da escola, roube os equipamentos de Quadribol e invada o campo? - Penny perguntou e confirmei com a cabeça - Eu topo, jogo de apanhadora!
- Seu irmão vai mesmo narrar o nosso jogo, pro mundo bruxo inteiro ouvir? - Flora falou interessada - Vai dizer nossos nomes e tudo? - confirmei com a cabeça outra vez - Eu topo também, mas sou melhor artilheira.
- Ótimo! Precisamos de dois times e como Anabela e eu vamos jogar, já somos quatro. Ainda precisamos de quatro artilheiras, uma apanhadora, três batedores e duas goleiras. Quem não for participar do jogo ficará nas arquibancadas, torcendo. Vamos lotar o nosso campo de Quadribol, fazer barulho de verdade. A professora Rousseau será a nossa juíza e a professora Cecile sua assistente. A rádio de Beauxbatons também transmitirá o jogo, Danielle será a locutora e Nani e nosso amigo Kwon cuidarão para que ninguém a tire do ar. Alguém mais se candidata?
- Conte comigo - Charlotte, a irmã de Marcel, levantou a mão sorrindo - Sou uma ótima goleira, meus irmãos me fazem jogar todas as férias.
- Obrigada, Charlie - sorri agradecida para ela - Mais alguém?

Como era de se esperar, depois que a Princesa de Mônaco aceitou jogar, as mãos foram levantando uma a uma, e logo já tínhamos mais que o necessário para montar os dois times. Millie se comprometeu a jogar como apanhadora e ajudou a montar meu time junto com Anabela. Jude se juntou a Penny e Flora e rapidamente completaram o time adversário. Os dois times eram formados de meninas de todos os anos, todas bastante animadas em participar. As que ficaram de fora logo se uniram para criar cartazes e faixas para pendurar por todo o estádio, Olívia entre elas.

- Meninas, podem ter certeza que vocês estão fazendo parte de algo grande - a professora Cecile falou tão animada quanto às demais - Esse dia vai ficar marcado na história de Beauxbatons e todas vocês poderão dizer que estavam lá. Não tenho a menor dúvida de que vamos conseguir isso.
- Amém, professora. Amém! - Anabela falou empolgada e todo mundo riu, retomando o falatório.

Ela tinha razão. Estávamos prestes a fazer história em Beauxbatons.