Das lembranças de Ian Lucas Renoir Lafayette
Férias de verão é aquele período que todo garoto ou garota que ainda está na escola anseia durante o ano inteiro, fazendo planos para aproveitar cada momento ou simplesmente fazendo promessas de dormir por dois meses inteiro, longe de qualquer tipo de material didático. Eu costumava contar os dias para as minhas até os meus 12 anos de idade. Minha família viajava para algum lugar da França, era sempre divertido. Bom, nós ainda fazemos isso, mas esta cada vez mais longe de ser considerado ‘divertido’.
- Ian, depressa! Os Lestel já estão prontos, não quero atrasar o programa!
- IAN! Sua mãe já chamou, não me faça repetir!
Passei pela sala emburrado, atirando minha mochila de qualquer jeito na mala do carro e me sentando ao lado de vovô e Sophie, mudo. Minha família, como todo ano, fazia a viagem anual com os Lestel. Eu adorava essas viagens quando criança, pois eram dois meses com Bernard numa praia ou campo aprontando, já que papai ficava sempre tão relaxado que esquecia de distribuir broncas. Mas esse ano já estava tudo se encaminhando para ser um porre. Vi meu amigo também com cara de poucos amigos dentro do carro do pai dele ao lado dos irmãos antes de partirmos.
Bernard tinha dois irmãos mais novos: Amélia, de 11 anos e Vincent, de 10. Amélia era a caçula, minha fã n°1, a menina me idolatrava. Confesso que já me incomodei muito com isso, mas agora não dou mais tanta importância. Vincent era o irmão do meio e a reencarnação do demônio. Se alguém me considera travesso, é porque não conhece o irmão menor de Bernard. Sobrava da turma nova nessa viagem, eu, Bernard e minha prima Sophie, que todo ano vinha conosco. Esse ano o destino era Cote D’Azur, em Saint-Tropez para ser mais preciso. Nossos pais fizeram reservas em um hotel na beira da praia e nossas mães tinham toda a viagem planejada em uma pasta, com horários até para respirar, nada podia sair errado. Como o balneário não é tão distante assim de Marselha, fomos de carro mesmo.
- Já chegamos?
- Não.
- Ok... Já chegamos? – perguntei de novo, de propósito.
- Já disse que não... – papai tentava não perder a calma
- Certo... Falta quanto?
Papai freou o carro de repente e bati a cabeça no banco da frente. Mamãe gritou com ele por ter feita ela derramar café no mapa e vi o carro dos pais de Bernard freando também atrás de nós, no susto. Ele se virou para mim com um olhar quase assassino.
- Se pretende me atormentar até Saint-Tropez, por favor, avise agora que lhe passo para o carro de Thierry.
- Posso mudar de carro??
- Não, não pode. Fique quieto Ian, não distraia seu pai! Você vai conosco e a mesma coisa na volta. Agora ligue esse carro e vamos embora Gerard, está atrasando nosso cronograma!
Papai tornou a girar a chave do carro e voltamos a estrada, eu mais revoltado ainda contando os outdoors que passavam pela janela.
***********************************************
- Voldemort matou 30, voldemort matou 30! É 30, é 29, é 28, é 27...
- CALA A BOCA VINCENT! Mãe manda o Vincent parar??
- Não enche sua chata!
- Chato é você, cabeçudo!
- VOLDEMORT MATOU 30! VOLDEMORT MATOU 30!,
- LALALALALALALA NÃO ESTOU OUVINDOOO!
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10... Minha avó sempre diz que quando você está ficando irritado, precisa contar pelo menos até 10 para não perder a paciência de vez. Encontrava-me nessa situação. Estava no carro com meus pais e meus irmãos indo para Saint-Tropez e Vincent vinha cantando a musica que ensinei a ele no começo das férias desde que saímos de Marselha. Ok, no começo estava engraçado, mas agora estava irritando. Amélia mantinha as mãos tapando os ouvidos e gritava para abafar a voz dele, tornando impossível ouvir as musicas que tocavam no radio. Eu estava preste a distribuir tapas naquele banco traseiro...
- Ei Amélia, me empresta sua boneca? – Vincent falou arrancando a boneca da mão da minha irmã
- Não, larga seu pentelho! Vai quebrar, solta!
- Me empresta, a perna dela ta machucada, tem que amputar! Só quero salvar a coitada!
- Mãããe, o Vincent arrancou a perna da minha boneca!
- Aaai, mãe, a Amélia puxou meu cabelo!
- Pai bate nele, ele ta me batendo!
- Socorro mãe, o Bernard ta me beliscando!!
Minha mãe virou para o banco traseiro e acertou três tapas, um em cada um de nós, encerrando a confusão e gritaria. Amélia chorava em silencio tentando recolocar a perna da boneca, Vincent alternava entre alisar o braço onde o tapa da minha mãe acertou e onde eu havia o beliscado com força para que ele parasse de perturbar Amélia e eu peguei a boneca da mão dela e com cuidado consegui encaixar a perna, passando minha irmã agora para a janela e ficando no meio dos dois, a fim de separa-los. Vincent me olhava desconfiado e falei entre dentes que ia bater de novo se ele sequer respirasse dentro daquele carro.
*****************************************************
- Saiam do carro, rápido!
- Não precisa mandar duas vezes tio!
- Ei Luke, sobreviveu à viagem também?
- Mais 15 minutos e papai largava Sophie e eu na estrada. O que é isso roxo no seu braço?
- Ah, mamãe me beliscou por bater em Vincent pela 3ª vez. Ele começou a cuspir dentro do carro e me irritei.
- Ele também apanhou, não? Porque ta com uma cara meio chorosa... – Sophie falou
- Sim, levou um belo de um tapa! Vamos dar uma volta, por favor? Se ficar mais um minuto perto deles, vou matar um!
Bernard foi pegar a mochila na mala do carro e veio ao nosso encontro. Saímos os três, ele, Sophie e eu, para dar um passeio ao redor do hotel enquanto nossas famílias faziam o chek-in. E começava então as férias de verão dos infernos das famílias Lestel e Lafayette...
No comments:
Post a Comment