Thursday, May 10, 2007

A noite do princípio

IM: Samuca, eu juro pra você! Ela é gente boa! Simpática, inteligente... E você está sozinho há tanto tempo! O que custa ir conhecer a garota?
SB: Nada Isa, não me custa nada. Só que não acho que esse seja o momento ideal para ficar marcando encontros! Acabei de voltar da minha viagem de formatura, a semifinal está chegando, tem um assassino solto no colégio e...
PB: E ele está mais uma vez inventando desculpas! – Patrick que até então vinha calado, comentou. Olhei nervoso para ele e ele sacudiu os ombros. – Ou vai dizer que não são desculpas? Um encontro para conhecer uma menina que está gostando de você não vai atrasar em absolutamente nada a sua vida!
IM: Obrigada Patrick!!! – mais empolgada que nunca. – Então? Vai ou não vai dar uma chance para a Dora?

Isa lançou um olhar pidão e acabei concordando. Talvez os dois tivessem razão, e eu só estava inventando desculpas para evitar encontros assim. De qualquer maneira, fui até o encontro. Na verdade, uma encenação. Isa e Dora estavam sentadas nos jardins conversando, e fingindo que eu não soubesse que elas estariam ali, me aproximei pra sentar com elas. Dora no começo ficou muito calada, mas depois foi se soltando e ficamos os três conversando um bom período de tempo. Quando o sinal para voltarmos ao castelo soou, Isa levantou de um salto.

IM: Eu realmente preciso ir até o campo de quadribol apanhar umas coisas antes de voltar ao castelo, mas vocês podem ir indo se quiserem. Samuca, acompanha a Dora até a Fidei, por favor? Você sabe... Lobo! – Isa sorriu marota e concordei com a cabeça. Dora sorriu.

Continuamos conversando até a porta da Fidei quando parei. Ela me encarou séria e depois começou a rir. Mas não um sorriso tímido, e sim, um sorriso despreocupado.

DG: Pode terminar o teatro. Eu sei que a Isa armou esse encontro só por que eu disse que gosto de você.

Fiquei sem saber o que dizer e ela continuou a sorrir.

SB: Na verdade o encontro foi marcado por ela sim, mas fui por que quis. Quero entender como você pode gostar de mim sem nem me conhecer!
DG: Amor platônico eu acho. Mas agora eu te conheço e nada mudou, então...
SB: Então... Quer sair de novo?
DG: Seria ótimo!
SB: Ok. Amanhã depois das aulas eu te procuro para darmos uma volta.

Foi assim que começou. No outro dia saímos. No dia depois também. Acabamos nos beijando. E estava realmente começando a descobrir na Dora ótimas qualidades...

°°°

- Monsieur Stardust, será que dá para parar com a brincadeira? – professor Armand chamou minha atenção mais uma vez, quando tive que prender o riso ao declamar um parágrafo de 30 linhas, que poderiam ser resumidas em 2, para Anne. – A peça será em duas semanas! Francamente! Vá se sentar. Você também, senhorita Renault!

Soltando o sorriso cômico, fui me sentar com meus amigos no fundo da turma de teatro e o professor Armand começou um verdadeiro monólogo.

- Duas semanas e isso é tudo! Só mais duas semanas e vocês se livram dessa peça. Mas sinceramente, até lá procurem levar com o maior grau de seriedade que puderem?! As caracterizações estão cada dia melhores, e confesso que me surpreendi muito com a maioria de vocês. Mas outros... – pausa para me encarar rapidamente – ainda não perceberam a seriedade do projeto. Então, por favor, agüentem só mais duas semanas? – a turma em silêncio concordou com a cabeça. – Tudo bem, por hoje é só! Stardust, Renault, me dêem mais uns minutos.

Rindo e se despedindo de mim, meus amigos foram saindo aos poucos da sala. Um minuto depois só ficou eu, Anne e o professor Armand que arrumava uma pilha de papéis em cima da mesa. Nos aproximamos e ele levantou os olhos categoricamente.

- Bom, eu quero sugerir que os senhores ensaiem mais. Eu sei que estão apertados com exames e todo o resto, mas as falas dos senhores precisa ser aperfeiçoada. Os dois. Nem parece que fazem um par romântico! Tem que ter sentimento, ou não vamos convencer ninguém.
AR: Tudo bem professor, vamos nos dedicar mais nas aulas e...
- Não senhorita Renault. Estava sugerindo ensaios fora do horário de aulas. Será que vocês estão livres no domingo, às 8 da noite?
SB: Mas professor, no sábado é a semifinal de quadribol e se ganharmos vou ter que treinar com o time diariamente! – disse depressa. Armand sorriu.
- Uma horinha. Não vai morrer por uma hora, vai? Vejo vocês no domingo?
AR: Tudo bem.
SB: Claro, ¬¬.

Peguei minha mochila e sai com Anne falando de como seria animado nosso ensaio a três com o professor Armand no domingo. Antes que pudéssemos dobrar um corredor, Dora apareceu e sorriu a me ver. Retribui. Anne parou nos olhando. Dora me abraçou e me deu um beijo em seguida.

DG: Você disse que ia me procurar durante o jantar! Fiquei esperando... – em tom chateado.
SB: Desculpa. O Armand nos prendeu lá até agora por causa da peça.
AR: Er... Tenho que ir. Boa noite.
DG: Tchau. – Dora disse seca, olhando Anne de cima a baixo. Senti o rosto ficar vermelho.
SB: Boa noite! Nos vemos no domingo então? – rindo. Anne afirmou com a cabeça soltando um sorriso tímido e dobrando o corredor.

De mãos dadas com Dora continuei indo em direção ao Salão Principal. Queria comer alguma coisa antes de ir para a Nox terminar os deveres.

DG: Vocês vão se encontrar no domingo por quê? – perguntou, mas não em tom de curiosidade leve e sim de interrogatório.
SB: Ah, temos que ensaiar mais. A peça está chegando.
DG: Mas as aulas de teatro?
SB: Não são suficientes. Armand pediu que nós dois ensaiássemos mais, por que não estamos passando todo o sentimentalismo que Shakespeare recomenda! – ri e Dora levantou as sobrancelhas.
DG: Não estão levando isso a sério demais? Pensei que fosse só um teatro.
SB: Foi na base de um teatrinho que eu te conheci não foi? – parei de andar, sorrindo, e percebi tarde demais que tinha falado alguma coisa atingível. A boca de Dora ficou pálida.
DG: Eu não pedi para a Isabel fazer aquilo!!!
SB: Ei, calma! Estou brincando! Eu hein... Às vezes você leva a sério demais, Dora.
DG: E às vezes você brinca demais! Vou para a Fidei.
SB: Boa noite então. – me aproximei para lhe dar um beijo e ela se afastou virando as costas. Respirei fundo e continuei o caminho até o Salão Principal sozinho.

°°°

A derrota do time da Nox na semifinal foi menos traumática do que eu cheguei a pensar. Na verdade, todo o time ficou triste, mas se comportou racionalmente. Dora não vinha falar comigo desde aquela noite, e eu, que me julgava o certo da discussão ou seja lá o nome atribuído, também não fui atrás dela.
Isa tentou interceder ainda umas duas vezes, mas vendo que eu não ia atrás dela para pedir desculpas por uma coisa que eu nem sabia o que era, desistiu de tentar.
No domingo à noite fui até a sala de teatro. Anne e o professor Armand já estavam por lá.

SB: Desculpem o atraso.
- Bem na hora, Samuel. Anne acabou de chegar também. Vamos começar?

Armand puxou uma cadeira e seu roteiro e se sentou. Ficou calado o tempo todo assistindo eu e Anne repassarmos cada uma das falas e fazendo algumas anotações.

SB: Minha pequenina, não lhe faltes à palavra. – segurando a mão de Anne.
AR: Não faltarei. Amanhã, no canteiro das primaveras, onde poderemos ir para bem longe de Atenas.

Ainda continuava segurando a mão de Anne e nos olhamos. Senti a mão ficar quente, mas sustentei o olhar. Então, sem nem saber por que, puxei Anne pela cintura com a outra mão e a beijei. Incrivelmente, ela correspondeu. O silêncio era absoluto na sala e quando nos soltamos, professor Armand levantou da cadeira tão rápido que nos assustou. Bateu palmas, eufórico.

- Mas vocês hein? Não só estão perfeitos, como demonstraram uma carga de sentimentos que jamais vi. Exuberantes! Inigualáveis! Parabéns!!! O beijo não estava no roteiro, mas sabem que podemos acrescentar? Sim! – puxou o roteiro e já ia anotar quando cai na real.
SB: NÃO! Professor! Eu não devia ter feito isso. Só o roteiro principal, por favor.

Armand pareceu extremamente decepcionado. Olhou para Anne mas ela nem parecia estar prestando atenção. Olhava o chão completamente calada. Me senti mal.

- Tudo bem então. Pelo menos demonstrem esse sentimento nas falas. Dispensados.

Anne saiu depressa da sala e foi difícil alcança-la no corredor. Puxei seu braço fazendo-a parar.

SB: Me desculpa. Eu não queria. Quer dizer, queria. Eu não podia!
AR: Por que você fez isso Samuel? Era só com os personagens...
SB: Não, não era!!! Pelo menos pra mim. Anne, eu acabei de descobrir que estou apaixonado por você. Não sei como, nem por que, mas é isso aí. Eu não tinha o direito mas fiz. Não vai acontecer de novo. Eu nunca fiz isso, nunca. É que aconteceu algo estranho e foi involuntário. Quando eu vi, já estava te puxando e... Você deveria ter me impedido!
AR: Desculpa, mas eu não tenho um reflexo tão bom quando sou agarrada durante um ensaio de teatro.

Não pude deixar de rir do tom de voz dela. Ela levantou os olhos para mim pela primeira vez, séria.

SB: Ouço sinos. Você não? – ela sorriu.
AR: Você está brincando não é?
SB: Quem dera!
AR: É bom que esteja, por que pra mim isso foi só uma encenação Samuel.

Colocando um ponto final, ela sumiu no meio de um grupo de alunos da Sapientai.

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