Das lembranças de Ian Lucas Renoir Lafayette
- Acha mesmo que isso funciona, Luke?
- Sim, eu li em um livro que você pode compartilhar seus sonhos com outra pessoa, mas não consigo fazer!
- Talvez não seja necessário isso...
- Como assim?
- Semana passada eu acordei assustado, depois de um sonho esquisito... – Michel parecia incerto de contar – Eu ouvia as mesmas coisas que você, só que...
- O que meus netos já estão tramando?
A voz grave do vovô nos fez saltar e olhamos espantados para ele, parado no meio do gramado do castelo. Era um sábado e Michel e eu estávamos sozinhos conversando, confabulando sobre algumas coisas, e a ultima coisa no mundo que esperávamos era receber a visita de nosso avô.
- Estão com as agendas cheias hoje? – vovô falou animado
- Nada para fazer em um sábado ensolarado – respondi sem entender ainda
- Ótimo. Quero que venham comigo, vamos dar um passeio
- Ahn, vovô... – Michel me encarou confuso e depois se virou para ele – não acho que podemos sair da escola sem a autorização da diretora
- Não se preocupem quanto a isso, já falei com madame Maxime, ela me autorizou a tirá-los da escola por hoje. Estarão de volta antes do jantar. Agora vamos, estamos perdendo tempo!
Ainda não compreendíamos o que vovô tinha em mente, mas obedecemos sem questionar e o seguimos para fora do castelo. Ele era a única pessoa que conseguia esse feito de Michel e eu: obediência sem questionamento. Quando já estávamos do lado de fora dos terrenos, no vilarejo vizinho, ele nos deu um papel com um endereço e pediu que aparatássemos até lá, pois ele faria o mesmo.
A principio não reconheci o endereço, mas assim que aparatei na calçada e dei de cara com aquela construção antiga, lembrei. Estava em frente ao Ste Napoléon. Vovô aparatou logo atrás de mim e tinha um sorriso satisfeito no rosto. Ele indicou a porta principal e entramos com ele na frente.
Logo na entrada tinha um balcão com dois recepcionistas, que preenchiam fichas e encaminhavam pacientes com os mais variados problemas para os setores correspondentes. No canto tinha uma placa indicando onde cada área se encontrava e meus olhos bateram direto na ala de danos causados por feitiços desconhecidos. Será que vovô me trouxe aqui para descobrir o que afinal aconteceu comigo?
- Vamos – ele nos empurrou em direção ao elevador – O hospital é grande e não temos o dia inteiro
- O que viemos fazer aqui, vovô? – Michel resolveu perguntar de vez
- Quero que vocês conheçam o hospital, afinal, eu sou o diretor dele e quero que meus netos conheçam o que será deles
Meu primo e eu nos entreolhamos e entramos em um consenso silencioso de não questionar mais nada, apenas acompanhar o vovô. Passamos o ia inteiro com ele, percorrendo cada canto do hospital. Ele nos mostrou todas as alas, lemos fichas de pacientes, conversamos com alguns deles, fomos apresentados a quase todos os funcionários e conhecemos toda a banca que comandava a equipe, incluindo Jacque Dubois, o vice-diretor do Ste Napoléon.
- Muito cuidado com ele – vovô falou quando deixamos sua sala – Ele quer tomar o meu cargo há anos, está apenas esperando que eu morra
- E por que não o demite, vovô? – era o mais lógico a se fazer, então o questionei
- Porque ele é um dos melhores curandeiros que existem. Esperem por mim aqui, preciso conversar com uma pessoa, mas não demoro.
Vovô nos deixou dentro da sua sala e saiu apressado. Michel começou a andar de um lado para o outro na sala e aquilo estava me desconcentrando, então o deixei lá dentro e fui andar sozinho. Vovô devia estar perdendo o juízo de pensar que Michel e eu conseguiríamos dar conta de um hospital inteiro sozinhos. Desci até a ala que tratava de acidentes com criaturas mágicas e o tal Dubois estava lá, perambulando à toa. Ele vinha carregando uma bandeja cheia de vacinas e vidros com poções, o nariz em pé e aquele ar de superioridade que normalmente os aurores assumem e que tanto me irrita. Não sei porque fiz isso, mas agi por impulso. Quando ele passou por mim, estiquei o pé. O homem voou longe e as vacinas e vidros de poções se espalharam por todo o corredor. Minha gargalhada logo denunciou que eu era o culpado e meu avô surgiu do nada, me agarrando pelo cotovelo e me rebocando para longe da confusão. Ele vinha me arrastando pelos corredores do hospital sem falar nada e só parou quando já estávamos outra vez em sua sala.
- Michel, saia, por favor – e me empurrou para cima da cadeira. Michel saiu sem nem contestar
- Calma vovô, foi só brincadeira! – tentei me defender – Ele nem se machucou!
- Você precisa crescer, Lucas!
- Mas pra que vovô? O mundo já é por demais amargo e se todas as pessoas se tornarem sérias, tudo vira uma chatice!
- Você precisa crescer, para que incidentes como o do feriado de páscoa não se repitam!
- Aquilo foi uma burrice, lhe garanto que não tornara a se repetir.
- Já passou da hora de você encarar as coisas com um pouco mais de seriedade. Estou velho, não tenho muito tempo de vida e o que vai ser dos meus negócios se meu neto insiste em agir como se tivesse 13 anos?
- Que historia é essa de ter pouco tempo de vida?
Ao completar a frase, uma sensação esquisita tomou conta de mim. A péssima sensação de Deja Vu... Já ouvi aquele diálogo, já tive essa conversa com o vovô. Tenho certeza que já disse essas palavras!
- Preste atenção, Lucas – vovô tinha um ar sério e temeroso e aquilo me assustou – Seu avô não vai durar para sempre, e você e Michel são meus únicos netos. As mães de vocês escolheram seguir carreira de auror, mas vocês optaram por serem medibruxos, como toda a geração da família. Quando eu morrer, vocês vão herdar tudo isso, e quero me certificar que os pacientes e equipe estarão em boas mãos. Quero morrer em paz, sabendo que vocês irão manter a tradição da família Renoir. Quero que quando vocês morrerem, o quadro de vocês fique ao lado do meu na parede daqui, e que vocês estejam deixando tudo a seus filhos ou netos. Esse hospital não pode ficar sob os cuidados de Jacque Dubois, em hipótese alguma! Prometa que vai crescer, prometa que vai ser mais responsável.
- Sim, eu prometo – falei quase gaguejando, sem nem ter tempo de refletir sobre isso
- Vou levá-los de volta a escola, ande
levantei da cadeira ainda assustado e segui vovô sem dizer mais nenhuma palavra. De fato, não falei mais nada até que já estivéssemos de volta a Beauxbatons. Michel também vinha calado, e sabia que ele estava curioso com o que vovô tinha conversado comigo. Ele nos deixou na entrada do castelo e se despediu, desaparatando. Michel no mesmo instante se virou para mim e perguntou o que tinha acontecido. Depois de relatar com detalhes o que vovô tinha em mente para o nosso futuro, ele se lembrou do sonho que estava me contando de manha, mas novamente fomos interrompidos. Dessa vez por gritos furiosos vindos da passagem para a Nox. Corremos até lá e nos deparamos com um Viera muito irritado. Dominique estava ao seu lado e parecia assustado. Entramos devagar e olhamos em volta. O quarto estava uma bagunça, tudo revirado, coisas quebradas, mas somente o lado do Viera. Na parede, a máscara do lobo pregada e uma escrita com tinta vermelha, que brilhava e chamava nossa atenção: ‘Quem brinca com fogo, pode se queimar’
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