Para completar a onda de maus presságios dessas últimas semanas, a Nox andava a um passo de ser desclassificada do campeonato, o que andava gerando uma terrível onda de desconforto e agressividade nos treinos e partidas. No último treino, Jardel começou a lançar desaforos para Bridget, e se nós não tivéssemos separado a tempo, talvez eles realmente tivessem avançado um contra o outro. Desde então, os treinos que deveriam estar com a taxa de aproveitamento bem maior para garantirmos a vaga, estavam cada vez pior e mais desgastantes.
A minha fuga nesses dias estava sendo nas aulas de teatro. Não que eu tenha mudado minha opinião sobre o quanto Shakespeare conseguira ser patético, mas lá eu podia ao menos dar umas risadas das interpretações desajeitadas de todos nós, e dos comentários cada vez mais “exuberantes” de Armand. O professor batia palmas tão euforicamente a cada cena, que por mais que nos sentíssemos ridículos falando aqueles textos, acabávamos acreditando que realmente deveria estar um pouco bom...
Sem saber se ia lá dizer um “oi pai, beleza?” ou se dava meia volta direto para o dormitório, fiquei parado uns segundos o encarando. Um dos bruxos que o acompanhava o cutucou de lado, e apontou a cabeça em minha direção. Se um segundo atrás eu tinha decidido ir embora, agora já não dava mais tempo. Meu pai interrompeu o assunto com Máxime e me encarou longamente, sua expressão cada vez mais funda e cansada. Senti o sangue gelar quando ele fez um aceno com o braço, mandando que fosse até lá...
OM: Fique a vontade, monsieur.
SB: Todas as evidências apontam contra mim, certo? Nós começamos a brincadeira sim, pai. Nós espalhamos sobre o lobo, só para causar medo... Mas as coisas saíram do controle e agora realmente existe um assassino, e ele realmente anda por aí matando as pessoas. É um aluno, temos certeza. Ninguém poderia ter colocado um punhal na minha mochila sem passar despercebido.
IS: Não poderiam ter sido os seus amigos? Que ainda não entenderam a gravidade da situação e continuam querendo brincar?
SB: Eu até pensei que sim no começo, mas agora eu tenho certeza que não foram eles. Eles estão sendo atacados. Esse lobo está indo atrás de nós, um por um. Acho que nós já conhecemos o limite de nossas brincadeiras...
IS: Então eu me formei e me vi seguindo um sonho que nem de longe era meu... Estágios no Ministério, de departamento para departamento. Candidatura a Ministro que eu perdi feio. Trabalhos cansativos, quase 20 horas por dia, até a outra votação que eu finalmente me vi ganhando. Mas aí meu pai já não estava vivo para comemorar comigo o Ministério. E até hoje sua mãe me pergunta se valeu à pena ter dado tão pouca atenção a ela e a você, para cuidar de um sonho que nem meu era, que deveria ter sido enterrado com meu pai...
SB: Valeu? – a pergunta saiu sem que eu soubesse o porquê de ter saído. Estava tão assustado com aquelas revelações todas, que me vi perguntar bem depois de já ter perguntado.
IS: Não. Não valeu. Só hoje, depois de quase 15 anos no Ministério, que eu consigo entender o quanto desperdicei meu tempo. Poderia estar administrando um criadouro de hipógrifos. Adestrando testrálios, domesticando pelúcios. E no entanto, eu tenho que cumprir oito horas diárias no meu gabinete de Ministro da Magia, fazendo coisas totalmente monótonas, vendo a única mulher que eu amei na vida sendo feliz com alguém que soube dar o amor que ela precisava, e vendo meu filho ser acusado de assassinato, prestes a se formar! Sabe o que é engraçado, Samuel? É saber que por mais que eu tenha pensamentos tão primórdios como os do meu pai, de querer te ver tomando o meu lugar, eu sei que nunca vou ver isso. Porque você aprendeu a se virar tão bem sozinho, sem mim, que já sabe muito bem o que quer e o que não quer para a sua vida, e não vai deixar ninguém atrapalhar esses planos.
IS: Sabe sim. É claro que você sabe. Seus olhos me contam que você sabe disso há muito tempo.
SB: Se eu disser o que eu não quero ser, você aceita a resposta? – mesmo estando de costas para mim, o vi rir e concordar com a cabeça. – Ministro da Magia, em primeiro lugar.
IS: Ótima escolha! – soltando uma risada alta.
SB: Medibruxo, sócio do Gringotes, professor... E me desculpa, pai, mas nem me passa pela cabeça ter uns dragões no quintal. – outra risada alta.
IS: Você acabou de excluir todas as profissões que um dia eu teria pensado para você...
SB: Desculpa.
IS: Por? Por ter sua própria personalidade? Desculpado. Então... O que te sobra? Vendedor de livros? De penas? De artefatos de quadribol? Ou quem sabe, jogador de quadribol? – ele fez a última pergunta muito pausadamente, e senti alguém prendendo meu estômago. – É, a última opção parece te agradar mais, não é? – virando-se novamente para me olhar. Ao ver que eu não sabia o que responder, ele sorriu. – Acho ótimo! Ótimo! Excelente! Um filho na Copa do Mundo de Quadribol!!! Uau! Que pai nunca sonhou em levar o filho em todos os jogos de quadribol do time que ambos torcem? E se quer saber de uma coisa, você vai ser um ótimo jogador! Te vi jogando esses dias...
SB: Quando?
IS: Eu estava aqui a negócios com Máxime e ocasionalmente fiquei sabendo de um jogo de quadribol com olheiros de times espalhados na arquibancada. Resolvi ficar para assistir, quando soube que era da Nox. Eles elogiaram muito você! Falaram até de uma vaga no Caerphilly Catapults...
IS: É, acho que sim... Eles iam te comunicar em breve, mas pedi que deixassem essa tarefa para mim. Então... Vai ou não vai para o país de Gales? – ele abriu os braços, e me deu um abraço longo, feliz. – Acho que devo te dar os parabéns, não?
Porque se você parar para pensar, na verdade não há...
Você me diz que seus pais não lhe entendem
Mas você não entende seus pais.
Você culpa seus pais por tudo, isso é absurdo...
São crianças como você!
O que você vai ser quando você crescer?
N.A: Música- Legião Urbana, Pais e Filhos.
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