Os campos estavam silenciosos.
A planície inteira parecia vazia, sem vida, sem um único som, mesmo do vento.
Porém seus instintos e seu treinamento não mentiam, ele não estava errado.
Havia caça ali. Uma lebre talvez.
Então um pio alto rompeu a tarde, seguido do barulho de penas batendo e um pássaro grande e majestoso alçando vôo. No mesmo instante o barulho de algo se movendo próximo de um arbusto foi ouvido e uma lebre acinzentada saiu correndo pela planície assustada. E isso foi um imenso erro.
A águia subiu até uma certa altura e seus poderosos olhos focaram a presa, e com um mergulho se jogou contra o chão. Seu vôo foi rasante e certeiro, pois entre suas garras a lebre lutava desesperadamente para se liberar, mas com uma única bicada, seus movimentos cessaram.
- Muito bem, Cronus! – falei feliz enquanto estendia o braço direito à frente de meu corpo. Cronus soltou mais um pio alto e voou de volta para mim com a lebre entre as garras. Ele soltou a presa aos meus pés e pousou em minha luva de falcoaria recebendo meu carinho pelo ótimo trabalho. Agitei a varinha e levitei a lebre alguns centímetros, colocando-a em minha mochila de caça, quando ouvi barulho de cascos às minhas costas.
- Ah, filho! Vejo que vocês dois fizeram um ótimo trabalho. Teremos lebre no jantar. – Papai falou sorrindo para mim do alto de seu cavalo. Eu retribui o sorriso enquanto dava pequenas tiras de carne crua para Cronus.
- E como foi a caça à raposa?
- Foi ótima. Haviam muitas raposas e nossos Hounds trabalharam perfeitamente. Pena que você não esteve conosco e nem seus irmãos, eu adoraria a companhia de vocês.
- É que eu ainda não havia praticado falcoaria desde o início das férias, e precisava treinar Cronus, mas ele está ótimo como sempre. E o senhor conhece o Procyon, papai, ele não gosta disso, infelizmente.
- Sim, queria que ele participasse mais disso...Venha, vamos voltar. – Ele falou enquanto girava o cavalo, mas andava lentamente, para acompanhar meu passo. Cronus não se assustava com o cavalo de papai devido à proteção para os olhos que eu recolocara. Ao longe, eu podia ver o restante dos meus primos voltando para nossa casa campestre, com no mínimo 5 raposas penduradas em suas celas. – Já quanto a sua irmã, essa violência toda não combina com ela...Não venha me dizer que estou sendo machista! Sou apenas um pouco conservador, e ela é minha única filha, é como se fosse de porcelana para mim.
- Papai, se você deixasse de ver a Gomeisa desse modo, veria o quão forte ela é.
- Eu sei que ela é forte, mas não é por isso que vou deixa-la fazer qualquer tipo de coisa! Fico contente com o relacionamento de vocês, seus olhos brilham quando fala de seus irmãos.
- Nós três nos damos bem, apesar do Procyon ser tão diferente de mim...
- Ele é bem diferente mesmo...Mas gostaria que ele se ligasse mais as tradições, que gostasse de caça como gostamos, que levasse a luta e duelo a sério. Mas amanhã faremos algo que até ele gostará. – Papai falou com um sorriso que sempre demonstrava que ele tinha algo em mente e foi o suficiente para me deixar curioso e ansioso.
- O que vamos fazer, pai? Gostaria de saber logo!
- Amanhã você saberá...Olhe lá, sua mãe voltou de Londres, vamos vê-la. – Ele impulsionou o cavalo a galope e tomou distância de mim. Me vi obrigado a não correr muito para não assustar Cronus, e quando cheguei em casa, papai já havia desmontado e abraçava minha mãe.
- Senti sua falta mãe! Como foi a reunião com o Ministro? Quando papai voltou de Paris, ele contou que vocês estavam se reunindo com os Ministérios, mas não quis me dizer o porque.
- Olá, meu filho. A reunião foi um sucesso. Consegui a autorização para que você e seus irmãos possam prestar exames de aurores antes do previsto. Poderão faze-lo até o final desse ano.
- Isso é ótimo, vou contar para eles, com licença.
Depois de beija-la mais um vez e de deixar Cronus aos cuidados de nosso tratador de animais, corri para casa e encontrei meus irmãos. Gomeisa lia um livro, enquanto Procyon fitava o céu por uma janela, claramente entediado.
- Isa, Procy. O Ministro aceitou que façamos os testes de aurores antes do previsto, poderemos faze-lo até o final do ano.
- Isso é uma ótima notícia, James. Poderemos nos tornar aurores juntos talvez? – Gomeisa falou enquanto colocava o livro que lia sobre a mesa.
- Grande coisa. O Ministério deve estar sem aurores decentes para permitir que crianças façam os exames. – Procyon respondeu me dando um olhar cínico e depois voltando a encarar a paisagem.
- Se me acha despreparado, venha me testar, irmão. Ou tem medo, assim como tem medo de caçar? – provoquei, com certa raiva na voz, já de varinha em punho. Procyon ficou furioso e me encarou também de varinha em punho.
- Você deve respeito a mim, James. Sou seu irmão mais velho, e herdeiro dessa família, portanto respeite-me.
- Mamãe nunca daria o poder do clã a você. Você mal consegue duelar e caçar como um homem!
- Chega vocês dois! – Isa falou furiosa também, e em questão de segundos, eu e meu irmão estávamos sem varinha. – Caso não saibam, eu sou a primeira da linha sucessora do clã. E VOCÊS dois me devem respeito, portanto já chega!
- Sim, Isa, desculpe-me. – Falei me sentindo mal por ter elevado a voz diante dela. Minha irmã tem uma influência enorme sobre mim, e com exceção de mamãe, ela é a única que consegue realmente me fazer me sentir mal.
- Só porque você é a mais velha não pode mandar em mim! Sou seu irmão gêmeo, nasci poucos segundos depois de você. E sou homem, tenho o direito de ser o sucessor. Já basta nosso pai ter deixado nossa mãe continuar líder do clã! – Havia desprezo em sua voz enquanto falava e isso foi a última gota para mim, que mesmo sem varinha avancei contra ele com raiva.
- Retire o que disse! Não permitirei que ninguém fale assim com minha irmã, e sobre meus pais!
- Esqueci que você era o cachorrinho deles, pequeno James. – ele falou com ainda mais desprezo e me encarou. Nós éramos praticamente da mesma altura, e eu era mais forte que ele devido aos meus muitos exercícios. Mas ele tinha habilidades mesmo que eu não admitisse.
- Já basta vocês dois!! – Mamãe surgiu na sala, os olhos brilhando de raiva. Com apenas um aceno da varinha ela nos jogou em nossas cadeiras e nos olhou severamente. – Procyon Asteris, o que você falou aqui foi algo forte demais. Se repetir isso novamente eu cuidarei para que nunca mais chegue perto de algo que goste. Você sabe muito bem que eu e seu pai chefiamos o clã juntos, e que eu saiba não o criei assim. Quanto a você Alderan James, nem mesmo o que seu irmão falou é desculpa para levantar a mão para um membro da família! Nós somos unidos e sempre seremos, portanto se eu ouvir mais uma discussão de vocês dois, vocês vão desejar não ter nascido. E obedeçam a sua irmã! Ela é muito mais sensata que vocês dois juntos!
- Nos desculpe, mãe. – Eu e meu irmão falamos juntos, cabeças baixas enquanto continuávamos sentados.
- Podem voltar ao que estavam fazendo, ou deixando de fazer... Bem quero vocês três amanhã prontos para viajar. Sem desculpas. Em breve suas aulas recomeçaram e amanhã nossa família fará uma incursão em uma reserva de Grifos próximo ao litoral grego, há notícias de uma grande quantidade de mortalhas-vivas e talvez um manticore. Nós iremos caçá-los. – A notícia de uma caçada mágica era mais do que suficiente para reunir a família. Meu irmão odiava caçar e duelar, mas sempre apreciava caçadas mágicas, quanto mais perigosas melhor e seu olhar demonstrava entusiasmo.
- Era isso que papai estava falando...
- Sim, era disso mesmo. Bem comportem-se até a hora da janta. Hoje além de nós e de seus primos, seus tios também virão jantar, assim como alguns funcionários do Ministério, é bom estarem prontos. – Mamãe falou enquanto se virava para terminar os preparativos.
- Bem, eu avisei vocês dois, vocês se excederam. Irei supervisionar vocês até o jantar. – Isa falou, tentando esconder a mágoa pelas coisas que Procyon falou.
- Eu não preciso de uma babá. Estarei com o Flavius, Edward e o Claudius. – Procyon falou enquanto saia da sala sem nem olhar pra trás. Ele sempre foi mais unido aos nossos primos paternos que a nós.
- Aii...Alderan, meu irmão, você não deve se deixar levar pelas provocações do Procy.
- Não tolero o jeito como ele fala de você e de nossos pais! Não irei tolerar ele falar essas coisas de vocês.
- Por que simplesmente não as ignora? Você não precisa ser tão severo o tempo todo. – Ela falou enquanto me abraçava, e como eu era mais alto que ela, sua cabeça batia em meu peito. – Ah, antes que eu me esqueça, seu amigo, o Tristan, mandou-lhe uma carta. Está em seu quarto, e Têmis já está alimentada e te esperando.
- Obrigado, Isa, irei responde-la agora. – Falei enquanto beijava seu cabelo e subia as escadas para meu quarto. Têmis me recepcionou com um pio alegre e voou para meu ombro enquanto eu me sentava numa poltrona para ler a carta do TnT.
“Caro AJ,
Como estão suas férias?Espero que Procy ainda esteja respirando, lembre-se que sua mãe, não entendo porque, gosta dele e espero que Isa continue gatinha, especialmente quando decidir sair comigo. Ok, calma, não precisa sacar a varinha, eu adoro sua irmã e quero que ela tenha o melhor (se escondendo).
Pronto parei de brincar com a morte huahua.
Aqui continua tudo na mesma, as paredes cinzentas estão no mesmo lugar e o diretor não vê a hora que 31 de julho chegue e fique livre de mim. Mas vou deixar a ele um presente de despedida. Lembra-se que contei que ele usa uma peruca que parece um bicho morto?? Pois no dia que estiver indo embora, eu vou fazer aquele bicho se rebelar. Será meu agradecimento por não ter permitido que eu passasse férias com sua família.
Jogue um pedaço de carne sangrenta para Cronus em meu nome, dê um abraço nos seus pais, tente não duelar com Procy (sabe que ele é sensível rsrs), e dê um beijo respeitoso em Isa por mim. Já falei que é um beijo respeitoso, não faça esta cara de irmão ciumento.
Até breve, amigo.
TNT."
Após terminar de ler corri para responder e em menos de 30 minutos, Têmis já alçava vôo com um pergaminho em sua pata, contendo a mensagem:
“Olá TnT,
Pensei até que tinha esquecido do seu amigo de suspensões.
Continue com as brincadeirinhas com minha irmã, que você vai ver que a vida no orfanato é mais divertida e colorida do que estar junto de mim com raiva!!
Minhas férias estão ótimas. Tenho caçado quase todo dia, hoje por exemplo passei o dia treinando o Cronus, e praticando falcoaria, e pode deixar que ele adorou o pedaço sangrento de carne. Foi uma pena não terem lhe dado autorização para passar as férias aqui comigo, você iria gostar e poderíamos caçar e explorar muito juntos.
Você irá a Paris antes do início das aulas?
Amanhã estarei indo para o litoral grego, não sei ao certo onde ainda, mas iremos em uma reserva de grifos, caçar uma quantidade estranha de mortalhas e um manticore que surgiu por lá. Seria ótimo se você fosse junto. Fora que eu teria a companhia de alguém interessante e divertido, não agüento mais o cinismo e o humor do Procyon! Ele teve a audácia de humilhar minha irmã e meus pais! Se mamãe e Isa não tivessem me impedido eu teria brigado com ele na mesma hora.
Se for a Paris me avise que nos encontramos antes.
Que tal aterrorizarmos um pouco as ruas parisienses?
Abraços, AJ”
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