- Então, Runas é um alfabeto? Alfabeto dos Vikings?! – Ulisses concluía pensativo quando eu interrompi minha explicação.
- Não. Não é um “simples alfabeto de escrita antiga”. Cada um dos símbolos é sagrado e autônomo. Cada runa representa um arcano ligado a entidades representativas de Deuses da mitologia nórdica.
- Ok. Mas já foram escritos livros com runas, certo?
- Certo. Hoje em dia, é raro, até por que poucas pessoas se interessam pelo estudo real rúnico. Mas livros antigos, de gerações, com segredos... Muitos deles são escritos em runas.
- Os Grimoires, por exemplo? – ele perguntou rapidamente e me senti congelar. O encarei.
- É, os Grimoires são um bom exemplo. – eu respondi ainda me sentindo um pouco tonta, mas tentando transparecer naturalidade. Afinal, qualquer um poderia conhecer a história dos Grimoires de famílias tradicionais e grandes magos...
Depois de alguns segundos, fechei os olhos. Só voltei a abri-los quando seguramente um par de mãos me agarrou pela cintura e meus pés novamente tocaram o chão. Vozes comentavam e perguntavam a todo redor, mas eu ainda estava entorpecida com tudo, e deixei meus pés me levarem para longe do barulho. O mundo voltava a ser quieto e parado quando fui pega de surpresa por um abraço seguido de um beijo longo, e não consegui reagir contra. Relaxei meus músculos e correspondi.
Novamente, o mundo começou a girar, porém, as cenas que se passavam agora eram muito nítidas...
Havia uma senhora, de aspecto cansado, deitada na cama. Seus olhos brilhavam astutamente. Ao seu lado, em uma poltrona, um jovem ainda cheio de vida, com os mesmos olhos, escutava com atenção o que a senhora lhe explicava. Eram instruções. Instruções para que o plano saísse perfeito.
Então, a cena mudou. Passou para o que eu reconheci ser o dormitório que eu dividia com Brenda. Estava escuro, mas havia uma única varinha acesa, e apesar de encoberto, o rosto do jovem era claramente reconhecível. Ele ditou um feitiço convocatório e de algum lugar ali perto, um livro saiu voando até sua mão, aberta. Ele o pegou e suspirou ‘Desculpa, Bella’, antes de apagar a luz da varinha. Tudo ficou escuro.
Abri os olhos e percebi que ainda estava beijando Ulisses no meio da ponte. Algumas pessoas nos observavam curiosas. O empurrei com violência. Não conseguia dizer nada. Ficamos nos encarando alguns segundos em silêncio, e a expressão dele mudou. Tirou o sorrisinho que antes estava desenhado em sua boca e cerrou os olhos. Corri.
- Isso é ridículo. Não podemos ficar correndo o restante do dia. – Ulisses arquejou correndo praticamente do meu lado. Me alcançou e segurou meu braço com violência, me fazendo parar. Uma onda quente de raiva tomou conta de todo o meu corpo.
- Não...toque...em...mim. – disse pausadamente o encarando e ele me soltou.
- Então vamos conversar civilizadamente.
- Vamos. Vamos conversar civilizadamente. Onde está o Grimoire?
- Onde está... o quê? – uma sombra de desespero passou em seus olhos, e as poucas dúvidas que eu tinha, acabaram naquele momento.
- Onde está o Grimoire da minha família, que você roubou no meu dormitório?
- Do que você está falando?
- Não adianta negar. Eu vi suas lembranças enquanto você me beijava.
- E como você tem tanta certeza de que isso aconteceu? – gritei de volta.
- Li no diário da minha avó. Ela conta como teve a idéia de escrever um Grimoire, como chamou sua avó para ajudá-la, e como ele finalmente ficou pronto. Então, ela não escreve mais nada, até 30 anos depois, alguns dias antes de morrer. O feitiço de memória que sua avó lançou perdeu a função e ela se lembra de como foi traída. O último relato que ela escreve é um apelo para que as gerações futuras da família Bonaccorso fossem atrás de seus créditos por direito. Por isso eu roubei o Grimoire de vocês. Ele passou anos escondido na mansão da família Damulakis, longe da possibilidade de roubá-lo. Mas em Beauxbatons, não. Ali foi muito fácil. Só precisei de um momento de sua distração, e uma oportunidade...
- Ótimo plano. Realmente brilhante. Só tenho uma pergunta a te fazer: você teve ao menos a curiosidade de decifrar uma das páginas daquele livro, antes de mandá-lo para a sua avó?
- Por que está perguntando isso?
- Porque eu sei que se você tivesse ao menos entendido bem de que espécie de feitiços estamos falando, não iria querer tanto assim ter esses “créditos” para a sua família. Falo isso por que quando descobri do que se tratava, passei a ter certo tipo de nojo de ser Damulakis.
- Me devolve o livro, Ulisses. Acho que você ainda não entendeu a gravidade do conteúdo dele... – tentei mais uma vez, em tom calmo, mas no fundo me controlava para não gritar. Ele sorriu.
- Desculpa, Bella, mas ele já não está mais em minhas mãos. Já não é assunto meu. Para completar minha parte do plano, só falta uma última coisa. Não iria fazer isso se você não tivesse descoberto tudo, mas agora eu preciso fazer.
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