Thursday, August 06, 2009

- Thomas, Frédéric, andem logo! – gritei da sala, impaciente.
- Eugène, você foi ajudar, não atrasar mais! – o Sr. Delacroix consultou o relógio – Desse jeito vamos nos atrasar.

Os três saíram correndo do quarto, meus irmãos de mochila nas costas e Eugène pegando a sua com seu pai. Era aniversário do Príncipe Remy e no lugar de uma comemoração grandiosa, ele havia convidado alguns amigos de sua idade para passarem o fim de semana no Palácio. Sabia que meus irmãos eram dois dos melhores amigos de Remy, mas a idéia de deixá-los naquele Palácio cheio de peças quebráveis e absurdamente caras me apavorada.

- Por Merlin, se comportem ok? – supliquei enquanto conferia se tinham guardado as coisas necessárias que separei e deixei em cima da cama – Não façam bagunça, obedeçam a quem ficar responsável por vocês, não corram dentro do Palácio e se acontecer alguma coisa, usem esse espelho de duas vias para me chamar – e entreguei a metade do meu espelho a Thomas, que era mais responsável.
- Relaxa, mana – Frédéric sorriu despreocupado – Não vamos dar nenhum prejuízo pra Realeza de Mônaco.
- É bom mesmo que nenhum dos três dê prejuízo – Sr. Delacroix falou meio rindo e meio sério – Teríamos que hipotecar a casa pra pagar um único vaso daqueles que enfeitam o hall de entrada. Estão prontos? Podemos ir? – eles confirmaram animados e ele se virou para mim e meu avô, de pé perto da porta – Trago eles de volta amanha a tarde, não se preocupem.
- Obrigado, Pierre – vovô agradeceu – Na próxima eu levo os meninos.

O Sr. Delacroix apertou a mão do vovô sorridente, embora seu sorriso ainda não fosse inteiramente feliz, e saiu com os meninos porta afora, desaparatando quando pisaram no quintal. No mesmo instante vovô pegou sua carteira em cima do balcão da cozinha e a guardou no bolso, conferindo se estava com tudo que precisava em mãos.

- Vou aproveitar que todos vocês estão fora e visitar um velho amigo para uma partida de pôquer sem compromisso – me avisou sorridente.
- Ah, não vou mais sair hoje, mas tudo bem, acho que vou ler alguma coisa – não consegui disfarçar muito bem o desapontamento. Esperava poder passar um tempo a sós com ele, sem meus irmãos gritando pela casa.
- Pensei que ia sair com seus amigos – dei de ombros, negando, e ele me olhou desconfiado – Precisa de dinheiro?
- Não vovô, não estou precisando de dinheiro – neguei rápido demais, era péssima para mentir – Só remarcamos para semana que vem.
- Bom, se precisar, vou deixar aqui na estante – e colocou 3 galeões debaixo do cinzeiro – Não vou demorar, é só uma partida. Estarei de volta antes de você dormir.

Vovô me lançou um sorriso carinhoso e piscou, desaparatando. Fiquei sozinha na casa e decidi gastar meu tempo à toa lendo um dos livros de sua coleção. Já tinha lido todos eles, mas era sempre bom reler meus favoritos, como Hamlet. Puxei o livro da estante quando o localizei e me acomodei em minha cama perto da janela. Diferente dos outros dias de verão, hoje o calor não estava insuportável e uma brisa agradável entrava pela fresta aberta. O vento leve era tão reconfortante que peguei no sono antes de chegar à segunda pagina do livro.

Quando acordei, a brisa agradável havia dado lugar a um vento frio e doloroso. Levantei esfregando as mãos nos braços, me abraçando para tentar me aquecer enquanto fechava a janela. O sol já havia se posto há muito tempo e o céu estava negro, quase sem estrelas, o que indicava que teríamos um tempo nublado no domingo. Sai da cama com um ar de preguiça assustador e me arrastei até a sala para conversar um pouco com meu avô.

- Vovô? – falei alto quando sai do quarto, mas a casa continuou silenciosa – Vovô? Está em casa?

Nenhuma resposta. Fui até a sala e não havia sinal dele, assim como na cozinha e nos quartos. A casa estava exatamente do jeito que a deixei antes de pegar no sono, até os 3 galeões continuavam debaixo do cinzeiro. Consultei o relógio para checar se não tinha dormido tanto quanto pensei, mas uma onda de pânico tomou conta de mim quando percebi que já se aproximava da meia noite. Vovô nunca chegou tão tarde em casa sem nos avisar e ele certamente não havia tentado telefonar. O barulho do telefone era tão alto que acordava até um urso hibernando. Vesti um casaco qualquer e sai para o quintal, dando uma volta no quarteirão à procura de algum sinal dele, mas o pânico me consumiu ainda mais ao perceber que ele não estava em lugar algum próximo a casa. Voltei apressada, tentando pensar no que fazer, e apenas uma idéia me ocorreu. Tinha que pedir ajuda.

- Alô? – ouvi a voz sonolenta de Henri do outro lado da linha.
- Henri? – falei com urgência na voz e pude ouvi-lo se agitando – Desculpe ligar a essa hora, mas não sabia para quem mais pedir ajuda, Bianca e Kalani foram passar o fim de semana em Saint-Tropez.
- Dani? – ele ainda parecia confuso, mas já estava alerta, sem a voz sonolenta – O que aconteceu? Você está bem?

Expliquei a ele rapidamente o que havia acontecido, da minha preocupação por meu avô não ter voltado para casa mesmo tendo afirmado que viria cedo, e em menos de 5 minutos ele estava aparatando no meu quintal. Deixei-o entrar e o abracei na mesma hora, me sentindo um pouco mais calma só por ter seus braços em volta do meu corpo. Henri pediu que me acalmasse e assumiu o controle de tudo, conseguindo que em menos de meia hora todas as pessoas próximas a nossa família estivessem cientes do que estava acontecendo. O Sr. Delacroix e Pierre chegaram às pressas na minha casa e logo depois a Sra. Perrineau apareceu também. O Sr. Delacroix organizou um esquema de busca para ele, Pierre, Henri e alguns vizinhos que se ofereceram para ajudar e eu fiquei em casa com a Sra. Perrineau, ligando para hospitais e delegacias. Mônaco não era tão grande assim, não era possível que não conseguíssemos encontra-lo dentro de algumas horas.

Mas não foi bem o que aconteceu. Nenhum hospital, delegacia ou até mesmo clubes de Mônaco sabiam do paradeiro do meu avô. Minhas esperanças estavam na equipe de busca que saiu pelas ruas tentando localiza-lo, mas as expressões cansadas e derrotadas que adentraram a porta da sala varreram minhas expectativas e novamente fui tomada por uma onda de pânico. Henri sentou ao meu lado e me abraçou novamente, falando alguma coisa para tentar me acalmar, mas eu não conseguia assimilar as palavras e compreender o que era dito.

Naquela noite a Sra. Perrineau insistiu que fosse passar a noite em sua casa, mas agradeci o convite e recusei. Queria estar em casa caso vovô aparecesse ou alguém trouxesse noticias, então ela se ofereceu para ficar comigo. Henri também não foi embora e já estava quase amanhecendo quando o Sr. Delacroix voltou de mais uma busca nas ruas com Pierre e avisou que ia em casa trocar de roupa e partir para a parte mais afastada da cidade, levando consigo algumas fotos que lhe entreguei do vovô e abordando as pessoas nas ruas para saber se alguém o vira. Depois de algum tempo a Sra. Perrineau e Henri adormeceram sentados no sofá, mas eu não consegui pregar o olho. Onde vovô foi parar?

(Continua...)

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