Wednesday, April 15, 2009

- Até daqui a pouco, mana – Andreas ajeitou a mochila nas costas e encheu a mão de pó de flu, atirando no chão – Rue Grimaldi, Monaco-Ville 980, Monaco!

Uma chama verde esmeralda o envolveu e segundos depois ele desapareceu, deixando a lareira da estação vazia. Olívia contou até 10 e pegou sua mochila, repetindo os passos do irmão. Esperava sempre 10 segundos, pois era o tempo que seus pais tinham de receber Andreas e deixaram a sala livre para que ela pudesse passar sem ser incomodada. Quando era pequena Olívia se incomodava com a falta de atenção dos pais, mas com o tempo aprendeu a não se importar com a clara preferência deles por seu irmão gêmeo. Agora, ao invés de se chatear, ela apenas retribuía na mesma moeda.

- Ah, ela chegou! – Olívia surgiu na lareira de sua casa e ouviu a voz de seu pai.
- Querida, por que demorou tanto? – ela ouviu sua mãe e procurou o olhar do irmão, confusa. Andreas sufocava uma risada ao lado dos pais, mas deu de ombros quando ela o encarou – Seu pai e eu já estávamos preocupados, ele ia agora mesmo até a estação!
- Eu esperei um pouco, para não... – mas não chegou a terminar a frase, pois seu pai a puxou para um abraço.
- Andreas, pegue a mochila de sua irmã, está pesada! – ordenou e o garoto correu para pegar a mochila de Olívia, subindo as escadas em seguida.
- O jantar vai ser servido, vamos para a sala – sua mãe a abraçou animada.
- Preciso trocar de roupa antes, passei o dia inteiro com essa – Olívia se esquivou do abraço da mãe – Já vou para a sala.
- Ok, mas não demore! E chame seu irmão também, quero a família toda reunida!

Olívia sorriu desconfortável para a mãe e subiu as escadas apressada, olhando para trás com uma expressão confusa. Seus pais ainda a observavam do pé da escada e quando acenaram desaparecendo pela porta que levava a sala de estar, Olívia correu na direção contraria e entrou no quarto do irmão gêmeo, que trocava de roupa.

- O que está acontecendo? – Olívia perguntou assustada, fechando a porta e jogando o corpo contra ela, como se pudesse impedir seus pais de entrarem – Caímos na lareira errada?
- Não, estamos na nossa casa mesmo, mas parece que ao avesso... – Andreas respondeu tão confuso quanto sua irmã, embora parecesse estar se divertindo.
- Então quem são aquelas pessoas lá embaixo e o que fizeram com nossos pais?
- Eles estão esquisitos mesmo, mas por que não relaxa e curte o momento? – Andreas vestiu um casaco por cima da camisa amassada e levantou da cama – Vai dizer que nunca quis saber como é ser o filho preferido? – Olívia hesitou e ele riu – Então! Aproveite e explore-os um pouco. Vai ser bom não ter os dois no meu pé por pelo menos uma semana... Vamos jantar? Estou faminto!

Olívia não se moveu por alguns segundos, mas acabou cedendo. Andreas estava certo. Apesar de estranho, ela não podia negar que havia gostado da atenção inusitada que seus pais lhe dedicaram. E já que não sabia o que a motivou e muito menos por quanto tempo ia durar, a melhor solução era aproveitar.

*****

O recesso de páscoa já estava chegando ao fim e o clima na casa dos Casiraghi continuava estranho. Olívia era constantemente paparicada pela mãe, que não a deixava sozinha por mais que 15 minutos, sempre querendo saber como estava indo na escola, dos amigos, dos planos para as férias e até sobre sua formatura. A garota não agüentava mais responder aos questionamentos da mãe, mas então lembrava de seu pai, que a cercava nos intervalos em que sua mãe a perdia de vista querendo conversar sobre os planos para o futuro. De repente, seu sonho de se tornar escritora não parecia mais algo absurdo do ponto de vista do pai. Era como se de uma hora pra outra ele aceitasse que sua única filha não tinha pretensão de ter como carreira ser esposa de alguém. Aquilo, embora satisfizesse Olívia, estava deixando-a desconfiada.

Era a ultima refeição com a família reunida antes de Andreas e Olívia voltarem à escola. Andreas contava sobre o fim de semana dos pais que a escola promovia todos os anos no mês de Maio e que seus pais sempre evitavam comparecer. Dessa vez, no entanto, ambos estavam animados por terem a chance de visitar Beauxbatons e conversar com os professores de seus filhos.

- Vai ser no segundo sábado de Maio. Quem está organizando as coisas na Lux é a Danielle, mas Olívia está ajudando, não é Lívia?
- Sim, estamos preparando uma recepção para os pais dos alunos da Lux no nosso salão comunal, algo mais reservado e separado do banquete oferecido pela escola.
- Isso é excelente! Estamos ansiosos, não vejo a hora de poder conversar com os pais do rapaz! – a mãe falou empolgada e Olívia percebeu o olhar severo de seu pai a ela.
- Que rapaz? – perguntou olhando de um para o outro.
- Ora Benoit, não me olhe assim, como se Olívia não soubesse de nada! – Cecile reclamou – Pois se é ela quem está namorando, como não pode saber que aprovamos?
- Do que vocês estão falando? – Andreas não se conteve e perguntou, vendo que Olívia encarava os dois sem dizer nada.
- Já sabemos que sua irmã está namorando o Príncipe Marcel, está em todos os jornais – Benoit explicou e sua esposa confirmou com a cabeça – Olívia, por que não nos contou? Estava com medo de alguma coisa?
- Bobagem! Medo do que? Marcel é um excelente rapaz! Eu, como uma mãe zelosa, não poderia estar mais satisfeita em saber que minha filha está em tão boas mãos!

Andreas deixou o suco de uva sair pelo nariz ao tentar abafar uma risada escandalosa e seu pai o olhou com ar de reprovação, logo desviando a atenção para a filha, assim como sua esposa. Ambos sorriam felizes e Olívia os encarava incrédula, sem palavras. Finalmente tudo fazia sentido. Todo aquele tratamento com ela, as boas vindas na lareira e as gentilezas constantes, não passavam de interesse. Seus pais achavam que ela ia se casar com o futuro Rei de Mônaco e queriam garantir que desfrutariam dos benefícios, pois sabiam que se continuassem a ignorar a filha, ela jamais permitiria que eles fossem morar no castelo.

- E então, minha querida? – a voz de sua mãe a tirou do transe – Por que não nos contou antes sobre o Marcel?
- Estava esperando para contar pessoalmente, mas acho que acabei esquecendo. Desculpe. – Olívia sorriu, mentindo.

Foi sua primeira mentira, e saiu sem que ela planejasse, sem que percebesse que estava confirmando aquilo que a faz brigar com Marcel uma semana antes. Ela não entendeu, naquele momento, porque havia mentido, mas de repente percebeu que havia gostado de toda a atenção que recebeu dos pais durante a semana e não queria que aquilo acabasse. Seus amigos haviam dito que ela devia relaxar e aproveitar os 15 minutos de fama e era isso que ela faria. O único problema era que eventualmente ele iria acabar, bastava que Marcel arrumasse uma namorada de verdade. E embora ainda pouco acostumada a todos os mimos que teve durante o feriado, Olívia ainda não estava preparada para voltar a ser ignorada pelos pais.

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